domingo, 26 de dezembro de 2010

O MELONAUTA 2010

Se me perguntarem se 2010 foi um ano perfeito para mim, direi que nem de perto. Teve pontos altos que me atiçaram e pontos baixos que me abateram. Aliás, será este o imperfeito normal do comum dos mortais. É do balanço final que fazemos chegados a estes derradeiros dias, quem se der a esse labor, que de forma recapitulativa encontramos os picos das nossas vivências. Tive de tudo um pouco. Algumas frustrações, um punhado de realizações, algumas tristezas e angústias, encontros, desencontros e reencontros, alegrias e pinceladas de felicidade que tudo amainaram. O ano está a findar de forma serena e muita bonita. A minha família, a minha companheira de sempre, os meus filhos para sempre, o meu neto adorado (causador de extremos sentimentos), e alguns dos meus melhores amigos proporcionaram-me o melhor Natal de que tenho memória. Com menos presentes de embrulho, mas com muito amor recebido e ofertado. Valeu vivê-lo!
Todos os anos faço uma resenha da música ouvida e dos espectáculos assistidos, culminando essa apreciação global num CD que tenho o grato prazer de oferecer a um punhado de queridos amigos que tem a amabilidade de aturar a minha forma de ser. Desta vez, vou também disponibilizar essa colectânea a todos os que me visitarem e estiverem interessados nas coisas musicais que ouvi durante o ano. Umas bem recentes, outras mais antigas, mas todas elas marcantes no meu constante evolutivo conhecimento. São dois discos, mais capas e interiores, onde poderão encontrar outros pormenores sobre as minhas escolhas.
Resta-me agradecer a todos os que chegaram até este meu blogue e que de alguma forma deixaram a sua opinião ou aproveitaram as publicações, contribuindo para a minha vontade de prosseguir.
E que venha 2011!

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Kila & Oki - Kila & Oki

Os Kila são a banda de Rónán Ó Snodaigh e seus compinchas, que há mais de vinte anos se vem dedicando à renovação e propagação da música tradicional irlandesa. Embora a sua carreira não tenha tido a visualidade merecida, facto infelizmente comum, o legado que vão deixar é de um valor indefinível.
A junção que fizeram da sua música com a de Oki, tocador de tonkori, instrumento de corda da tradição Ainu, povo da Ilha de Hokkaido/Japão, revela o assombro da feliz conjugação dos sons emanados e irmanados. Da Irlanda vêm as uilean pipes, o bodhrán, o dulcimer, o tin e o low whisles. Do nordeste japonês, o tonkori de Oki. Mas, pelo meio, aparecem-nos o djembe africano (percussão), a darabuka árabe (percussão) e o didjeridu (sopro) dos aborígenes australianos.
Deste encontro entre Ocidente e Oriente, desta aventura afortunada, desta partilha de tradições e culturas, dimana uma obra de singular expressão que deverá ser escutada com os sentidos bem despertos. Ficamos ali pelo meio, entre o passado e o presente, com um ouvido no futuro.

K & O

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

The Blind Boys of Alabama - Spirit of the Century

Estes rapazes invisuais começaram a cantar gospel nos fins dos anos 30 do século passado e conseguiram chegar até aos nossos dias, mau grado terem ido perdendo os seus fundadores durante a sua caminhada. No entanto, foi apenas neste século que viram o mundo a tomar conhecimento do seu já longo trabalho. Para isso terão contribuído em muito, algumas ligações que encetaram com algumas personalidades notórias do pop-rock-blues, das quais cito Ben Harper, Bonnie Raitt, Lou Reed e John Hammond.
Este disco contém tradicionais e versões de trechos de Tom Waits, Ben Harper e até dos Rolling Stones. É festa e devoção, com um encanto muito especial, dado por quem utiliza a velhice como um dom.

Blind Boys

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Vinicio Capossela - Ovunque Proteggi

O universo de Vinicio Capossela é tão vasto que não se confina à sua música. Expande-se pela literatura, pelo teatro, pelo cinema, pela rádio e televisão, evidenciando a sua avidez pela criação de formas diferentes de expressão. Não é fácil classificar o seu trabalho, pela multiplicidade de influências e pela prodigiosa mistura de fontes musicais.
É um devoto de Tom Waits e não foi por acaso que convidou o guitarrista Marc Ribot para com ele trabalhar.
A panóplia de instrumentos que usa e faz usar, poderá dar uma ideia daquilo que se apresenta diante de nós. Ou pode ainda provocar maior embaraço. Para citar apenas alguns: harmónio indiano, marimba, chocalhos de Tonara, órgão de garrafas (tem mais deste género), teremim (um dos primeiros instrumentos electrónicos), balafon, shofar (arcaico instrumento de sopro judeu), banjo, dobro, sousafone (um gigante idealizado pelo luso-americano John Philip Sousa, o homem das marchas), har hu (violino), sheng (órgão de boca), xun (flauta cerâmica), os três últimos de origem chinesa, vários teclados electrónicos e muitos, muitos outros menos exóticos, divididos por cordas, sopros e percussões.
Foi então, mais ou menos, isto que perdi, quando Vinicio passou pelo Teatro Aveirense e quando esta sala ainda era um viveiro de boa música...

Ovunque Proteggi

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Gonzales - Solo Piano


Depois de fechado um capítulo, é hora de abertura de um novo. Saldei todas as contas musicais que deixara para trás e vou voltar a memórias mais recentes e divulgar discos que entendo serem importantes para quem queira actualizar os seus conhecimentos ou quem decida começar a abrir janelas a outros ventos.
Gonzales, de seu nome Jason Charles Beck, nasceu no Canadá e aproveitou o facto do seu irmão mais velho estudar piano, para iniciar o seu auto-estudo do instrumento, isto quando tinha três anos de idade. Mais tarde fez formação clássica mas foi na música pop que iniciou carreira.
Músico de excessos e sem preconceitos estéticos ou barreiras de expressão, tem percorrido várias áreas de composição, interpretação ou produção. Andou pelo hip-hop, fez entretenimento em bares, acompanhou filmes mudos, executou trabalhos para os Daft Punk, David Bowie, Jane Birkin, Charles Aznavour, citando apenas alguns, e como poderão atestar, oriundos das áreas mais díspares. Encontrei-o também no excelente Multiply de Jamie Lidell e perdi-o quando visitou Aveiro. Troquei-o por um soporífero musical do Cirque du Soleil e mil vezes me arrependo, acabando por perder também o músico que aqui trarei logo a seguir.
Este é o trabalho de Gonzales mais simples, minimalista e muito bonito, diferente de tudo o que fez durante a sua extensa obra.
Foi este o espectáculo que me escapou.

Piano Solo

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Amália - Segredo

Já me foi pedido por aqui que colocasse esta obra para audição. É com ela que vou terminar mais um capítulo da minha melomania. Segredo já tinha sido abordado por mim, nesta página.
Este é um disco editado postumamente, contendo gravações inéditas e algumas versões nunca publicadas. Acompanham Amália, Raúl Nery, Fontes Rocha, Júlio Gomes, Pedro Leal, Carlos Gonçalves e sempre, sempre Joel Pina. A maioria das composições é, naturalmente, de Alain Oulman e temos poemas de Reinaldo Ferreira, Cecília Meireles, David Mourão-Ferreira, Ary dos Santos, Manuel Alegre e Alexandre O'Neill. Destaco deste último, um poema maior, denso, voluptuoso e amargo. A amargura das pessoas que vivem e temem a solidão, como ela.
Tudo isto foi gravado por Hugo Ribeiro nos Estúdios Valentim de Carvalho, durante as famosas e intermináveis sessões, para as quais Amália levava, muitas vezes, farnel para aquela gente toda.
Numa visita que fiz há alguns anos aos estúdios de Paço d'Arcos, alguém que não recordo, falando da facilidade ou dificuldade de gravar esta ou aquela voz, das tormentas passadas com os desafinados, mostrou a maior admiração pela capacidade natural de Amália, em apontar as imperfeições ou erros supostamente cometidos. Erros esses que estariam apenas na sua cabeça, pois era perfeita!
Estas gravações ocorreram entre 1965 e 1975, período em que se encontrava no topo da sua maturidade vocal e no do rigor interpretativo de grandes textos.
Para ouvir e emocionar!

Segredo

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Amestoy Trio - Le Fil

Sou um declarado e assumido amante daquele que considero o primeiro instrumento, a voz! Isso não impede, de forma alguma, que vibre com a escuta de todos os outros, com predilecção por este ou aquele.
A conjugação dos três aqui manuseados e assoprados, é prova do que atrás afirmo. Apenas e por uma vez, um discreto piano aparece no meio deles. Toda a elegância e sensibilidade que os fazem exalar, sobrevoa-nos em estereofonia repartida em três e ocupa o espectro que se dispõe diante de nós.
Aqui trouxe, pela primeira vez, este trio admirável, merecedor de atenta audição.

Le Fil

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Rónán Ó Snodaigh - Tip Toe

Rónán continua sendo um dos mais singulares recriadores da música tradicional/popular irlandesa. Fá-lo com prodigioso engenho e fino trato. O seu trabalho, profícuo, matizado e fértil, orienta-nos para ares e locais de harmonia que, embora conhecidos, nos soam a frescura, no modo e no efeito. Tem a notável peculiaridade de nos surprender e de nos conduzir a estados encantatórios. Este seu álbum tem edição de 2001, mas se procurarem outros trabalhos posteriores, terão oportunidade de verificar que as qualidades se apuraram.

Tip Toe

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Eliseo Parra - De Ayer Mañana

Este disco é uma pequena maravilha e uma lição de etnologia baseada no folclore espanhol, confluindo com outros que lhe estão intimamente ligados. Os violinos levam-nos ao México, as tablas e as flautas à Índia, o alaúde ao norte de África, o berimbau ao Brasil, dando nós conta de visita ao nosso Mirandum e vislumbrando uma guitarra de teclas.
Mas não é tudo pureza. A sujidade contemporânea aparece naturalmente, sorrateira e envolvente.
O pensamento de Eliseu está bem patente nas suas declarações inclusas no disco. Traduzo-as tentando não as deturpar:
Preciso saber de onde vim e conhecer-me melhor. O que inicialmente era uma procura da minha verdadeira cultura, tornou-se no reconhecimento de uma música tão forte que nenhum compositor pode superar. A música tradicional, composta por um indivíduo - sem o intuito de ganhar dinheiro - foi entregue ao povo, este apoderou-se dela, passou-a aos seus descendentes até que chegou até nós como uma jóia polida à força de tanto ser cantada e tocada. Sem campanhas promocionais, nem monopólios de mercado. É desta maneira que a retomo, que a recrio o melhor que sei e a passo aos seguintes.

De Ayer Mañana

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Amadou & Mariam - Wati

Sempre que oiço este álbum, o meu disco duro cerebral traz-me a lembrança de várias sonoridades já escutadas. Uma delas, logo a abrir, lembra-me o british blues e os Fleetwood Mac de Peter Green, como poderão comprovar com a audição do tema que incluo na Minha Caixinha de Música.
Preparem-se então para esta mescla de guitarras blues e rock, vilolinos árabes, flautas africanas, tablas indianas, metais das Caraíbas e muitos instrumentos do Mali.
Estou na fase final do labor que me impus e que consiste em disponibilizar a audição integral de obras já aqui reportadas por mim. Esta é uma delas.

Wati

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Xaile - Xaile

Não me alongarei muito mais discorrendo sobre este disco e sobre esta banda. Trata-se de uma caso paradigmático na música popular portuguesa. Tiveram tudo para ser um êxito de grandes proporções, mas nunca ultrapassaram um estranho limbo que impediu maior sucesso. Isto não significa que o trabalho é fraco, ou que se tratou de um lapso de estratégia editorial. O fenómeno deverá igualizar outros tantos que todos os anos despontam, emergindo apenas um par de felizardos. Quantos discos de grande valia não são ignorados ou desprezados, mesmo até votados ao desconhecimento? Vale a pena ouvir este disco de ponta a ponta, coisa perfeitamente fácil, e descobrir o porquê do que atrás afirmo. Tenho a convicção que a forma pop mais ligeira que atravessa o disco, não terá sido muito bem digerida pelos mais ortodoxos e a forma folk não cativou a outra parte. E isto pode ser lido como preconceito dos dois lados.
Quer se goste, ou menos goste, esta será uma obra marcante no rico historial da música portuguesa.

Xaile

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Yungchen Lhamo - Ama

Pouco deverei acrescentar ao que sinteticamente descrevi no comentário que aqui publiquei em Janeiro de 2008. Este continua a ser o seu disco mais recente e o apetite de ouvir novas lucubrações foi crescendo à medida que o tempo foi decorrendo sem novos frutos.
Enquanto não surge outro disco, contentemo-nos com este, onde os cânticos tibetanos se ligam a sonoridades ocidentais em perfeita harmonia. Sacia-se o vazio com este prazer que nos consola os sentidos e o espírito.
Comprei-o, como vários outros, usado e em excelente bom estado de conservação. Paguei mais pelos portes do que pelo CD, mas valeu bem a pena!

Ama

terça-feira, 31 de agosto de 2010

Tinariwen - Amassakoul

Cá volto a esta banda assaz peculiar, dada a insólitas e sucessivas combinações de membros, justificadas pelo seu estilo nómada e vagueante do Sahara. O colectivo adapta-se às circunstâncias, tem alguns elementos mais constantes e tal como nos blues, partem do tema para o improviso, fazendo dele e das fusões afro-americanas os seus maiores suportes. Digamos que actuam os que estão mais à mão...
Foi este disco que lhes abriu definitivamente a porta do mercado europeu e lhes granjeou o apreço de notáveis e do público dos festivais de World Music. Também fulcral terá sido a aproximação que tiveram aos Lo'Jo que lhes proporcionou uma outra visibilidade, até aí muito discreta.
Ainda este ano voltaram a Portugal e estiveram no Festival de Sines. Depois deles, outras bandas com características semelhantes apareceram no panorama da especialidade, mas foram os Tinariwen que abriram caminho.

Amassakoul

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Rodrigo Y Gabriela - Rodrigo Y Gabriela

Na minha primeira abordagem a este belo par de músicos, acabei dizendo que muito gostaria de os ver ao vivo. Estive a um passo de isso acontecer. Rodrigo e Gabriela foram oficiosamente anunciados para actuar em Aveiro durante o ano de 2008, mas as comedidas, mesquinhas e retrógadas políticas culturais da actual Câmara Municipal impediram que a cidade se ufanasse da exclusividade e o país musical enriquecesse o seu programa de concertos. Ficámos desapontados e cientes de que melhoras...só num futuro!
Este duo está vocacionado para os concertos. De quatro discos já editados, metade são registados ao vivo. Como vêem, o desgosto é ainda mais profundo.
Vamo-nos contentando com a sua audição e esperar que nova ocasião surja no nosso horizonte.

R y G

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Concha Buika - Mi Niña Lola


Em 2008 classifiquei este disco como o meu preferido de 2007. Agora, e à distância de mais dois anos, continuo a manter a mesma opinião, solidificada com o tempo e com repetidas escutas. De lá para cá pude desfrutar das suas mais recentes edições e tenho para mim que esta é a sua melhor obra até à data. Isto não significa que as outras são menores ou omissas de grande qualidade. Julgo que a novidade na época, aliada ao enorme "estrago" emocional que em mim provocou, são a razão mestra desta minha preferência. Ainda hoje a pele se me contrai e os pêlos se me eriçam quando oiço Mi Niña Lola!
Por esta altura era ela uma quase genial desconhecida que veio depressa a ganhar alguma popularidade e vasta notoriedade. Continua a ser pura emoção e a audição das suas obras é obrigatória.

Mi Niña Lola

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Egschiglen - Zazal

Volto a este disco para disponibilizar a sua audição integral. Espero sinceramente que tenha um impacto semelhante àquele que me atingiu quando o ouvi pela primeira vez.
Há obras assim. Marcam-nos de forma indelével, suportando o pó dos tempos e a sua audição atenta é sempre fonte de prazer.
Intemporal é também a música que transportam pelo mundo, oferecendo-a com o rigor exigido a embaixadores de tradições em vias de extinção.
É a terra, a pureza, a manipulação hábil dos artefactos, a arte única e enlevada da voz, é a melodia harmoniosa.
São jóias raras que urge preservar, divulgar e afagar. São património, são nossas!

Zazal

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Gjallarhorn - Sjofn

Para além do que já defini da primeira vez que aqui trouxe esta fabulosa banda, apenas me apraz sublinhar que cada audição revisitada nos faz descobrir uma riqueza prodigiosa de sonoridades inexpectantes. Leva-me isto a dizer que ouvir este disco é quase uma viagem de cinema-documentário sobrevoando vales e penhascos, ora planando suavemente, ora vertiginosamente mergulhando a pique nos densos canoros. Uma experiência altamente recomendável.

Sjofn

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Farlanders - The Farlander

Desde que publiquei a minha primeira impressão sobre este disco, várias coisas descobri sobre esta dupla russa e posso acrescentar que a surpresa inicial deu lugar ao reconhecimento de dois artistas notáveis que, sem uma visibilidade notória, têm mantido trabalhos separados, unidos pela paixão da sua música comum. Pelo que consegui descobrir terão trabalhado em conjunto e pela última vez ao lado de Mari Boine no ano de 2001, tendo gravado com ela o álbum "Winter in Moscow". Existe outro trabalho ao vivo com o título "Moments", editado em 2000 e que não consigo saber se é do grupo ou se foi feito em nome de um deles.
Fazendo parte do Moscou Art Trio, Sergey começou desde logo a desdobrar-se em múltiplas actividades, estando intimamente ligado ao enorme sucesso das Vozes Búlgaras nos anos 90. Relevantes ainda os seus trabalhos com o Volkov Trio e o álbum "Journey" de 2000, gravado com um quarteto vocal feminino.
Inna, uma bela mulher e uma bela voz, manteve sempre um vigorante labor, aliando-se a díspares sonoridades, tendo editado em 2008 o seu último cd/dvd "Winter". Sem largar o folk russo do horizonte, facilmente se embrenha pelo rock ou pelo jazz, misturando electrónicas com música feita à mão, envolvendo-se em algum elanguescido psicadelismo.
Este disco lembra algumas bandas dos anos 60/70 que cultivaram o folk, o jazz e o art rock. Estou a lembrar-me dos Jethro Tull, dos King Crimson, dos Gentle Giant ou dos Focus. Será que não lhes lembrou o mesmo também?
Movam-se ambos por um qualquer território musical, nunca abandonam as raízes donde vêm nem os ares da tundra vizinha.


quinta-feira, 24 de junho de 2010

Huong Thanh - Dragonfly


Os mais assíduos visitantes já deverão ter reparado que entrei numa fase de retorno a obras já aqui por mim trazidas, embora sem as ter disponibilizado na íntegra. Espero desta feita contribuir para uma apreciação mais concreta desses trabalhos que mereceram a minha atenção em passado recente e que continuam a fazer parte da minha pasta de favoritos.
Este CD de Huong Thanh apareceu-me em corrente. Andava a ouvir Richard Bona, puxei um bocadinho pelo fio, trazia Dhafer Youssef, depois Nguyên Lê, mais um pouco içado e revela-se-me esta vietnamita desconhecida. São correntes preciosas com invulgares ornamentos para os sentidos.
Na Minha Caixinha de Música (Juke Box) deixo uma amostra do dueto Bona/Thanh e dos sons que os embalam.

Dragonfly

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Dhafer Youssef - Electric Sufi


Não tenho muito mais a acrescentar aos breves comentários que fiz da primeira vez que abordei o autor e a obra.
Continuo a procurar este disco para audição, o que não é coisa que faça com muitos outros, significando que há sempre uma expectativa latente em ir ao encontro de paisagens sonoras que não foram totalmente contempladas.
Uma boa escolha para nos acompanhar nas noites quentes de estio (imaginem-nas...), ou em frente duma lareira inverniça. Em suma, para ouvir sempre!

Electric

terça-feira, 25 de maio de 2010

António Chainho - A Guitarra E Outras Mulheres

Chainho, para alguns o "mestre", para outros um "invasor" das tradições fadistas, lançou este álbum em 1998, ainda a chamada "World Music" titubeava no panorama musical das grandes massas.
Para este virtuoso da guitarra portuguesa não bastou o engenho, enfrentando as mutações constantes da arte, sempre reconfigurada no tempo e nas vontades. Estas coisas não se fazem de forma isolada, existem sempre as fontes de inspiração e o trabalho paralelo de outros artistas e técnicos contemporâneos. Para a realização deste CD, várias associações foram feitas, com instrumentistas, cantoras e músicos de várias origens. Podem anotar Fernando Alvim na viola, Vinícius Cantuária na guitarra de 7 cordas, pandeiro e percussões, Greg Cohen no contrabaixo e arranjos, Charlie Giordano no acordeão e as cantoras de língua portuguesa Elba Ramalho, Marta Dias, Nina Miranda, Filipa Pais, Sofia Varela e Teresa Salgueiro.
Para ilustrar este post deixo, na "Minha Caixinha", uma amostra do resultado de algumas dessas misturas. Indeciso na mulher a escolher, optei por incluir aquela que ele mais abraça: a guitarra!

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Richard Bona - Munia: The Tale

Nascido Bona Pinder Yayumayalolo, este camaronês distinto cedo demonstrou as suas aptidões para o fascínio das artes musicais. Logo em criança começou destramente a tocar balafon, instrumento idiofone de origem africana, tendo construído a sua primeira guitarra com recurso a cabos de aço de travões de bicicleta. Umas belas e fortes cordas que não deveriam deixar os mimosos dedos em muito bom estado...
Foi na igreja e no seio familiar que Bona deu os primeiros passos da sua carreira. Cedo também reconheceu que era totalmente limitativo o lugar onde vivia, confrontado com o impulso a que desejava dar asas.
A audição de Jaco Pastorius veio a tornar-se determinante para o seu futuro e para o percurso a partir daí encetado. Partiu para Paris, onde se dedicou ao estudo musical durante sete anos, tendo em simultâneo colaborado com vários músicos, tais como Didier Lockwood, Marc Ducret, Manu Dibango ou Salif Keita.
Insaciável na procura de conhecimento e na aprendizagem do jazz, parte para Nova Iorque e por lá vai esbanjando os seus talentos a par de Larry Coryell, Steve Gadd, Pat Metheney, Georges Benson, Bobby McFerrin, Brandford Marsalis e muitos outros.
Este seu disco é um composto de todas as suas vivências, desde o berço até aos clubes de jazz e aos palcos dos grandes festivais.
O trecho que escolhi e coloquei na Caixinha de Música é exemplo disso mesmo. Está lá tudo, o jazz, o seu folclore natal, algum pop-rock escorreito, muita fusão e sempre executados com uma flutuante elegância.

Munia

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Pietra Montecorvino - Napoli Mediterranea

Este é um disco de canções napolitanas, algumas delas sobejamente conhecidas, trauteadas e que moram nas lembranças dos que já contam mais de quarenta anos de idade. Ouvimo-las cantadas por Peppino Di Capri, Claudio Villa, Renato Carosone ou mesmo por Caruso e Pavarotti. O Sole Mio ficou célebre na voz de Elvis Presley e com troca para It's Now Or Never.
O grande trunfo de Pietra e de quem a produziu, foi o de pegar em canções estafadas e revigorá-las com roupagens do outro lado do Mediterrâneo. Há uma alma rouca e sentida à mistura com ecos árabes.
Esta foi a primeira vez que sobre este disco falei.
É pena que Pietra não se firme em qualidade perene, objectiva e se perca, por vezes, por paragens duvidosas. Esta inconstância não a faz perder o brilho que remanesce de toda a sua carreira, mas impede-a de granjear maior notoriedade.

Pietra

terça-feira, 30 de março de 2010

Flor Amorosa - Flor Amorosa

Alice, Vanessa, Andrea, Anna Maria e Dudáh, duas vozes soprano, duas meio-soprano e uma pianista, arranjadora e directora musical. São estas as "atrevidas" que um dia decidiram meter a foice em seara de chorões, designação dada aos que compõem e tocam o choro brasileiro, vulgo chamado de chorinho e que já tem uma provecta idade acima do século.
Este género musical esteve quase em exclusividade dominado por homens e poucas mulheres se atreveram a mexer nos padrões que o regiam.
O chorinho sempre foi baseado nos instrumentos de corda, flauta e pandeiro. Aqui, as vozes educadas, são acompanhadas ao piano, proporcionando a descoberta de que os limites do chorinho são bem mais vastos e a sua riqueza incontável.
As cinco senhoras revisitam clássicos como Tico-tico no fubá de Zequinha de Abreu, Brasileirinho de Waldir Azevedo, Odeon de Ernesto Nazareth, um dos mais importantes compositores de choro e Flor Amorosa, que inspirou o nome do grupo e é da autoria daquele a quem é atribuída a sua origem, Joaquim Calado.
O chorinho não é triste por natureza, mas pode fazer chorar, aliás como muita música que nos toca bem fundo nas emoções.

Flor

sexta-feira, 19 de março de 2010

Hazmat Modine - Bahamut

Há músicas que logo aos primeiros acordes me fazem desencadear uma série de emoções que podem ir do bater do pé, ao especar atento, ou, em esporádicas situações, do soltar do arrepio. A música destes senhores teve o condão de me fazer suster os labores da hora para lhes dedicar toda a minha atenção e disponibilizar à surpresa sonora que aos poucos me invadia. Não é frequente deparar com um agrupamento de instrumentos tão heterogéneo, onde se incluem harmónicas, tuba, trompete ou fliscorne, sax, duduk (sopro milenar de origem leste europeia e médio oriente), guitarras eléctricas, guitarras havainas e steel, bateria e doshpulur (um "banjo" tuviano), mais uma voz soando a Tom Waitts. Com essa amálgama de timbres e de origens debitam um estimulante jorro sinfónico a que não podemos restar apáticos.
Estes nova-iorquinos brincam a sério e através de influências do blues, do jazz, do reggae, do klezmer, do country e da música cigana, atingem as nossas expectativas com um swing transbordante.
Apareceram-me pela frente quando andava à descoberta do canto da garganta tuviano e fui surpreendido pela sua utilização em algumas partes do disco. Foi a cereja no cimo do bolo!
Já estiveram em Portugal e felizões deverão ter sido aqueles que tiveram o ensejo de assistir às suas prestações ao vivo.
Aqui está a minha primeira referência à descoberta.

Bahamut

terça-feira, 2 de março de 2010

Sainkho Namtchylak - Time Out (Seven Songs For Tuva)

Estamos perante uma cantora de definição intrincada, pela variedade das suas interpretações, pelas vertentes díspares que explora e pelo experimentalismo que lhe está sempre associado.
Nascida em Tuva, extremo sul da Sibéria, iniciou-se pelo tradicional canto da garganta, percorrendo, até à data, percursos de jazz, electrónica, música ocidental, sempre com as bases no Leste e na Ásia Central.
Senhora de formação muiscal superior, trabalhou na Moscow State Simphony Orchestra, em vários grupos de jazz e de música folclórica da sua região natal.
Filha de nómadas, ela própria é uma errante dos sons que povoam os seus discos e as suas performances.
Dotada de voz ímpar e com a capacidade que lhe é atribuída de a estender por sete (!?!?) oitavas, é uma vocalista de conhecimento obrigatório. Depois pode-se gostar, ou não.
Actuou em Portugal e em Aveiro no ano de 2002, onde passeou as suas imensas virtudes e algum mau feitio, diga-se de passagem. Não tive ocasião de assistir ao seu concerto e vim a conhecê-la neste seu trabalho que no conjunto da sua obra se pode considerar acessível.

Time Out

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Inti-Illimani - Andadas

Um grupo que é uma verdadeira instituição e que encontra paralelo em Cuba com a Orquesta Aragon, ou com os Chieftains na Irlanda. Contemporâneos de Victor Jara e influenciados pela nova abordagem da música tradicional chilena, da qual um dos nomes maiores é Violeta Parra, formam-se em 1967, editando os primeiros discos no ano seguinte. Depressa ganham estatuto e tornam-se aliados culturais do regime de Salvador Allende. O reconhecimento internacional chega logo a seguir e os concertos pela América Latina e pela Europa também. O golpe militar de 1973, liderado por essa figura sinistra chamada Pinochet, apoiado pelos americanos, derruba o sistema democrático e aniquila o presidente. Por essa ocasião andam em tournée pela Europa, e sem possibilidade de voltar a casa a salvo de represálias, decidem residir em Roma e aí continuar a sua carreira. Após quinze longos anos de exílio, regressam ao Chile em Setembro de 1988, onde são recebidos apoteoticamente no aeroporto de Santiago, por uma multidão que entoa as suas canções e o hino nacional.
A união durou até 2005, até que irresolúveis divergências musicais e estratégicas levam à cisão do grupo. Por resolução judicial são impedidos de usar o nome original e nascem assim os Inti-Illimani Histórico e os Inti-Illimani Nuevo. As propostas divergem mas ambas mantêm qualidade e respeito pelo passado comum.
Em Andadas ainda podemos ouvir a voz emblemática de Max Berru, co-fundador do grupo e que viria a retirar-se em 1997. Música chilena com saibos latinos vizinhos que se prolongam até ao México.

Andadas

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Oi Va Voi - Laughter Through Tears

Uma das grandes virtudes da pop actual é que franqueou as suas alas e deixou-se imbuir das sonoridades escondidas, reveladas pela magnífica globalidade da divulgação e da procura. Ao contrário de outras correntes musicais que se mantiveram dentro das suas rígidas fronteiras e com pouca disponibilidade para aventuras, a pop penetrou noutras áreas, buscou motivos e ofereceu a sua eterna juventude.
Esta banda londrina soube fazer essa junção de forma escorreita, partindo da influência judaica e da música klezmer, proveniências latentes de alguns dos seus elementos, e distribuindo esses sinais pela eminente e transversal pop que constroem.
Num grande misturador, coloque-se rock, dance, trip-hop, klezmer, gypsy, Europa Central, Médio Oriente, electrónica, clarinetes, trompetes e violinos. Se isto não der para ter uma ideia mais precisa, então é crucial ouvi-los e proceder à avaliação do resultado de todo este mistifório. Acreditem que vale bem a pena!
Foi por esta altura que os descobri...

L T Tears

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Amaro Del - Baro Than

Esta banda sérvia, sediada em Belgrado, é quase desconhecida na Europa. Para além de uma ou outra incursão no mercado de concertos em pequenos espaços na Áustria, Alemanha, Holanda e Suiça, as suas apresentações estão praticamente confinadas ao seu país e à Roménia. Estamos perante a música cigana tradicional, captada e arranjada por gente de gosto sensível e técnica invejável. Composta por Branislav Spasojevic, voz principal e líder, Milena Bozovic, contrabaixo e voz principal, Darko Zheheli, guitarra e coros, Marko Milovanovic, guitarra e coros, esta banda destaca-se pela beleza simples que produz. Em conversa netiana que mantive com Branislav, já lá vai um par de anos, este mostrou uma grande vontade de tocar em Portugal, pois apenas conhece Lisboa e por outros motivos. Já transmiti este seu desejo a um agente português, mas não é fácil apostar em bandas quase desconhecidas, ainda mais em tempo de crise. Vê-los e ouvi-los ao vivo, seria uma gratificante experiência, a juntar ao sempre ávido desejo de deparar com o diferente e com a fascinação.
Eis a primeira referência feita aqui por mim aos Amaro Del.

Baro Than

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Mônica Salmaso - Iaiá

Foi com Mônica Salmaso que aqui me iniciei nos comentários discográficos, tendo eleito este seu trabalho como um dos melhores que ouvi em 2007. Mônica é intérprete por excelência e exclusividade, dando um cunho particular e incisivo aos temas que escolhe para cantar. Tem feito a sensata e inteligente opção de se aliar a músicos e compositores de nível superior. Só para exemplificar posso acrescentar aqui os nomes de Edu Lobo, Guinga, Baden Powell, Vinicius de Moraes, Tom Jobim, Arnaldo Antunes, Naná Vasconcelos, Toninho Ferragutti ou Chico Buarque, mas muitos mais haveria.
Este foi um daqueles discos que entrou em mim duma assentada, tirando o fôlego, criando vontade de repetir e guardado sempre à mão. Aos temas de domínio público, juntou composições de Jobim, Jair do Cavaquinho, Buarque, Joyce, Caymmi, Tom Zé e outros, num harmonioso painel de música popular. Mônica, como sempre, faz-se acompanhar de um lote excepcional de instrumentistas que provocam, em ligação à sua voz única, uma fascinante viagem sónica pelo Brasil popular. Arranjos, harmonias, voz de afinação, colocação irrepreensíveis e timbre distinto, são razão directa para proporcionar uma obra destacada e bela.
A sua participação activa na Orquestra Jazz Sinfónica de São Paulo e na Orquestra Popular de Câmara, são mais duas grandes causas que abraçou em prol da música da sua terra. Devidamente reconhecida? Se calhar, não!

Iaiá

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

LHASA DE SELA


APENAS HOJE O SOUBE E GOSTARIA QUE NEM O SOUBESSE OU QUE DE UM TERRÍVEL EQUÍVOCO SE TRATASSE. MAS É A IRREMEDIÁVEL VERDADE E A PROFUNDA INJUSTIÇA. UMA DAS MINHAS MAIS QUERIDAS CANTORAS FALECEU NO DIA PRIMEIRO DE JANEIRO COM APENAS 37 ANOS...
RESTA-ME A LEMBRANÇA, ATÉ AO FIM DO MEU FIM, DE, NUMA NOITE ENCANTADA, A TER PODIDO ESCUTAR E VER, NAQUELE QUE TERÁ SIDO, PARA MIM, UM DOS MAIS BONITOS ESPECTÁCULOS DE SEMPRE.
LHASA, UMA VOZ IMORTAL!
Mais um ano de músicas ficou para trás, deixando na lembrança muitas audições, alguns concertos e firmando este projecto em que me lancei. Desejo e espero que 2010 continue a proporcionar-nos o ensejo de encontrar por esse mundo fora, formas musicais que nos mantenham despertos para uma paixão que faz parte da nossa vida e sem a qual não podemos viver. Falo por mim em forma plural, sabendo que muitos outros partilham deste ideal.
Um excelente ano para todos quantos me visitam, com muita felicidade e muita música para nosso encanto!