quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Akli D - Ma Yela


Nascido Akli Dehlis, este argelino de semblante bonacheiro, foi bem jovem para Paris, onde encetou carreira no seio da comunidade berbere. Foi também aí que procurou outros interesses artísticos, fazendo formação de actor.
Entretanto adquiriu influências de outras origens, desde o reggae ao rock, e daí até à sua estreia discográfica, seria um pulo.
De Paris para a Europa e para toda a parte e com a contribuição bem patente neste disco de Manu Chao, esteve de passagem em Portugal no Festival de Sines.
Há por aqui uma grande confluência de culturas e de estilos. O som é exuberante e abre sempre caminho à surpresa de cada início de faixa. Bom para ouvir duma assentada ou em pitadas separadas.

Ma Yela

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Ólöf Arnalds - Vid Og Vid


Não me recordo como descobri Ólöf e este seu disco. Posso, no entanto, e sem qualquer dúvida, afirmar que se tratou dum belo encontro.
O fascínio pelos largos horizontes, sejam cálidos ou gelados, sempre me acompanhou e sempre me trouxe imagens musicais de grande beleza. 
São sons simples que advêm de composições, instrumentos e voz duma delicadeza que surpreende.
A Islândia tem destas coisas. Tanto nos pode esmagar com sons profundos como os de Sigur Rós, ou com a energia das máquinas de Björk. É nesta última que podemos encontrar algum paralelismo, quer na aparente fragilidade da voz, quer nas melodias que nos transportam pelas areias e glaciares. Basta cerrar olhos e embarcar.

Vid Og Vid

segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Geoffrey Gurrumul Yunupingu - Gurrumul


Gurrumul é um músico indígena australiano que canta no dialecto Yolngu e nasceu desprovido desse sentido único que é a visão. Talvez por isso tenha desenvolvido outros que lhe concederam uma peculiar intensidade de expressão interpretativa.
Não se espere um disco diferente, complexo ou inovador. Gurrumul é a simplicidade. Dele emana uma paz e uma delicadeza de estilo que nos enleva.
Dispenso-me de mais comentários e lanço o convite para a sua audição. Cai bem neste início de Outono, propício a depressões, arauto dos frios próximos. Esta voz acalenta.

Gurrumul


quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Tango Negro Trio - Tango Negro Trio


Tango Negro é um projecto do quase octogenário trombonista, pianista e cantor argentino Juan Carlos Cáceres. Completam o trio, Marcello Russillo na bateria e Carlos "el tero" Buschini no baixo. Daniel Binelli é o convidado especial para o inevitável bandoneon.
Este disco veio-me parar às mãos em altura crucial nas minhas congeminações musicais e teve o condão de me despertar novas ideias.
É tango, é mais que tango, são passagens pela negritude da batida, por outros sons que nos são familiares e que nos vão saltando ao caminho durante a audição da obra.
Este é mais um daqueles casos que comprova que a idade física está longe de agrilhoar o poder da criação artística. 
Aconselho vivamente e sem moderação...


quarta-feira, 17 de julho de 2013

Quiné - Da Côr da Madeira


O mês de Junho foi atribulado e por boas causas.
A falta de tempo levou a que descurasse a cadência mais ou menos regular das actualizações do sítio.
Bastantes horas dos dias desse mês foram por mim passadas com este músico maior. Meu mestre, meu cúmplice e meu amigo. Foi, e é, um grato privilégio poder trabalhar com alguém em quem confiamos e em quem também sentimos reciprocidade nessa confiança. É confortante e cria estímulos para novos voos.
É assim, desta singular forma, que aqui lhe presto homenagem e lhe manifesto gratidão.
O Quiné já anda nas músicas há muito tempo e sempre escolheu boas companhias.
Foi também escolhido por alguns dos mais importantes músicos de diversas áreas da música popular portuguesa. Basta fazer uma consulta à sua página - http://www.dacordamadeira.com/ - para terem uma noção do seu percurso.
O disco é quase todo feito por ele, com algumas ajudas na produção e misturas, nas vozes e noutros instrumentos.
Quiné toca timbila, kalimba, kissanje, adufes, caixa portuguesa, bombo, bilhas, congas, shakers, guizos, peneira, e, como ele diz, outras miudezas. Ah, e ainda canta.
Entre originais e tradicionais, acabando num tema de Rui Júnior, podemos deliciar-nos com o seu destro e inspirado virtuosismo.
São tesouros destes, escondidos, meios perdidos, que dificilmente aparecem nas rádios ou nas televisões. Temos mesmo que, à laia de garimpeiros, partir à sua descoberta.

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Mayra Andrade - Stória, Stória...


Cabo Verde é uma fonte inesgotável de músicos. Cada ilha tem os seus ritmos, o seu dialecto próprio e formas diferentes de difundir a música dum país dividido pelo mar.
Mayra é mais uma jóia desse tesouro musical. Que inova, que recolhe, transforma, modela e os predicados nos oferece em salva.
Tive a grata felicidade de a ver e ouvir quando passou por Aveiro para divulgar este seu disco. Deslumbrante. Encantou pelo trato, pela simpatia, pela superlativa competência e pela alma interpretativa.
Se já era fã, maior apreciador fiquei.
Irrepreensível na selecção de temas e autores, sempre bailando a língua por entre dengosas cadências e envolventes melodias.
Ignorar ou desconhecer Mayra, é pecado sem remissão.

Stória, Stória...


terça-feira, 23 de abril de 2013

Ensemble Montreal Tango - Enamorada


Já nem me lembro de que forma este disco veio parar às minhas escutas.
Decerto terá sido numa feliz e inusitada oportunidade, pois estes ilustres desconhecidos merecem ser ouvidos e partilhados.
Victor Simon, pianista de origem argentina, é o director musical e foi o fundador do Ensemble. Faziam ainda parte do quinteto à altura da edição deste disco, Mélanie Veaugois, violino, Elizabeth Dubé, violoncelo, Denis Plante, bandonéon e Christophe Papadimitriou, contrabaixo.
Estamos perante um grupo de amantes da dançante música popular argentina que se dedica à exploração relevante do Novo Tango.
No alinhamento estão incluídas versões de duas peças do mestre Piazzolla.
Do Canadá para o mundo, com o encanto argentino.

quarta-feira, 27 de março de 2013

GAC - Pois Canté!!


Há discos que pressentimos ficarem datados e sem futuro. Seria o caso de Pois Canté!!, não fosse a sua fresca intemporalidade estética e a sua inovadora musicalidade. Aquilo que poderia ficar redutoramente marcado, seria o texto lírico, fortemente politizado e intervenientemente situado na época. 
Diz-nos a História que por vezes as histórias se repetem, para o bem e para o mal.
A parte estritamente musical, vocal, instrumental e de arranjo, está lá, soberba, indelével, exemplar, que serviria de fonte de inspiração a vindouros.
A parte textual, para nossa desventura, ganha, em muitas ocasiões, razão de actualidade, gerada pela escumalha política dirigente, de forma indigna e corrupta que fez regredir a democracia e os valores arduamente conquistados ao correr de quase uma geração.
Se até há algum pouco tempo, este disco pareceria uma peça de museu, volta a ser importante para lembrar ou relembrar os mais esquecidos. Ontem como hoje, FMI, Troikas e outros braços armados do poder económico mundial, ditam leis, desumanizadas e predadoras.
Oiçam...bem alto!

Pois Canté!!


quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Dobet Gnahoré - Ano Neko

 
Há daqueles discos que nos prendem desde os primeiros segundos até ao esgotar das últimas notas.
Ano Neko é um deles, pelo menos comigo teve esse peculiar atributo. Cada tema abre-se para novas descobertas harmónicas, quer instrumentais, quer vocais.
Dobet viu-se refugiada em França, para onde tentou escapar à conturbada situação social vivida na Costa do Marfim, seu país natal. 
Foi na Europa que construiu a sua carreira, com o suporte das suas ancestrais influências e ao lado de músicos de elevada qualidade, com especial relevância do guitarrista francês Colin Laroche de Féline, com quem partilha vida e divide autoria de canções.
O reconhecimento do seu trabalho veio com a atribuição de um Grammy e de um BBC Award, embora isso não seja, por si só, sinal de que estamos perante coisa de valia. É preciso ouvir, sentir os luxuriantes sons com que ela nos presenteia, para auferir essa importância.
Cabaças d´água e muitas outras percussões tradicionais à compita com outros instrumentos de características mais contemporâneas, moldados a constantes arranjos vocais de extrema beleza, fazem deste disco uma peça obrigatória para quem busca na música, popular, ou não, uma forma artística de comunicação de excelência.
São os sentidos dos outros a entrar por nós adentro. 

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Tarika - Soul Makassar


Pela informação disponível a que tive acesso, este terá sido o último disco que a banda produziu e já lá vai uma dúzia de anos. No entanto, e por pesquisas posteriores, encontrei imagens de concertos bem mais recentes, em que ao nome original acrescentaram a palavra Bé. Há, também informação em que o nome é acrescentado por Sammy. Assim, é bem provável que continuem a existir, a difundir a música de Madagáscar e a sua íntima relação com a debandada do povo indonésio rumo a Oeste, por ocasião da grande erupção do Krakatoa, nos anos 500 AD.
São duas mulheres que lideram a banda, Hanitra e Noro. São elas as responsáveis pela escaldante mistura de guitarras eléctricas e instrumentos acústicos tradicionais.
A exuberância marca todo o álbum. São doze faixas de música tradicional, onde a única excepção é uma versão da mui célebre Be My Baby de Phil Sepctor, grande êxito na voz das Ronettes em 1963.
Uma bela compra em segunda mão. O disco vinha como novo. Ou o anterior dono nem sequer o ouviu, ou então tinha um tremendo mau gosto.
Deliciem-se com esta fatia de cultura malgaxe.
Em nota à margem quero referir que no ano de edição deste disco, a Time Magazine incluiu Tarika na lista das 10 melhores bandas do mundo, a par dos U2 e dos Radiohead...

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

O Melonauta 2012


Colectânea de algumas das mais interessantes propostas que tive oportunidade de ouvir em 2012.
Estão incluídos alguns músicos que vi em concerto durante o ano agora findo.
Aproveito para desejar a todos um Feliz 2013!
Viva a música!

O Melonauta

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Sierra Maestra - Rumbero Soy


Já com quase quarenta anos de actividade, Sierra Maestra é um dos mais emblemáticos grupos da música tradicional cubana.
Competência, renovação e devoção aos melhores símbolos musicais e à memória colectiva, são atributos em que assentam as suas referências.
Para este álbum convidaram alguns ilustres nomes, dos quais quero salientar os do saudoso Ibrahim Ferrer, da grande, grande Omara Portuondo e do guitarrista americano, sempre curioso pela variedade cultural, Marc Ribot.
Há cheirinho transversal a Buena Vista, o que só lhes fica bem.

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Madeleine Peyroux - Bare Bones


Madeleine Peyroux vem a propósito do novo álbum de Ana Moura que surgirá a público no próximo dia 12 de Novembro. Logo que soube que seria Larry Klein o produtor desse disco, lembrei-me dum punhado de produções que levou a cabo e por entre elas encontrei este belíssimo trabalho da cantora/autora americana.
Quem a não conhece, basta ouvi-la nos primeiros vocais para logo despontar a memória de Billie Holiday. Embora outras boas lembranças nos sejam activadas, só esta bastaria para prender a nossa atenção.
Estamos perante um smooth jazz elegante, envolvente e sedutor, próprio para longas noites de Outono ou Inverno, onde à música se podem associar uns bons bebericos, uma cálida lareira e uma agradável companhia.
Para quem julga que apenas dedico atenção a músicas doutros mundos...

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Dino Saluzzi & Anja Lechner - Ojos Negros


Este disco belíssimo junta o bandoneon de Dino e o violoncelo de Anja, sem qualquer músico adicional.
Ao contrário de Piazzolla, que nunca se afastou dos ritmos do tango, mesmo que sabiamente brincasse com eles, Saluzzi procurou nas cordas da violoncelista clássica um encaixe mais fluido e menos sujeito à característica da dança.
A génese não desaparece, mas o tango surge espraiado, com sincopados dispersos, ocasionais e tudo é poético na expressão, mesmo desprovida de palavra.
Agora que o Verão está a despedir-se, este é um disco outonal, perfeito para sossegar em distantes meditações ao cair da tarde.

Ojos Negros

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Burhan Öçal & The Trakya All Stars - Oynamaya Geldik


Programações, metais, muitas vozes de permeio, violino omnipresente, tambores troando e sincopando, caracterizam, no fundamental, este disco possante. Não podemos, contudo, omitir o piano, instrumento  também tocado por Burhan quando se desliga das percussões que domina de forma magnífica.
Funky cigano, muito groove que vai da primeira à última faixa. 
Este saliente músico de origem turca que já viveu nos Estados Unidos e na Suiça, move-se em áreas diversas, desde o jazz até à clássica.
Durante dez anos acompanhou Joe Zawinul (Weather Report) no seu projecto de jazz sinfónico. Tem tido uma intensa actividade distribuída por bandas e ensembles, querendo eu evidenciar por questões de identidade, a sua colaboração com a nossa pianista Maria João Pires.
Se tiverem um pouco de curiosidade, semelhante à minha, poderão procurar um extenso manancial produtivo deste excelente músico. Podem começar por aqui...

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Djeli Moussa Diawara & Bob Brozman - Ocean Blues


From Africa to Hawaï é o subtítulo deste belo disco onde se cruzam a kora e a slide guitar num cativante registo plural. São dois amigos que partilham um incomensurável prazer de fazer música, sobrepondo e unindo sons que cada um deles levou na bagagem.
Cantam-se e tocam-se blues e outras composições de raiz africana em peculiares junções com ambientes indianos ou caribenhos.
Onze temas a descobrir e manipulados pelo génio de um guitarrista/etnólogo americano e de um outro mestre da kora guineense.
Há momentos de grande intensidade emocional onde a musicalidade latente nos leva a sentir uma certa pele de galinha. E não há melhor sinal de emoção para nos denunciar. Ou talvez não. Uma lágrima é sempre muito mais embaraçante.

quarta-feira, 11 de julho de 2012

Alfredo Marceneiro - Quadras Soltas


Como já ouvi ou li, Marceneiro não é, ou foi, um fadista qualquer, ele é o próprio Fado!
Não poderia estar mais de acordo com tal apreciação.
Tardiamente me dei conta do seu extraordinário valor, mas ao longo dos anos tenho procurado saber sempre mais do homem e da sua obra.
Este disco é uma súmula muito condensada de todo o seu percurso. São apenas nove fados reunidos e editados pela editora Ovação e apenas três deles eram fados tradicionais. A par de um Mouraria, de um Corrido e de um Vianinha, esta diminuta colectânea engloba seis fados compostos por ele e que viriam posteriormente a ser declarados também tradicionais e designados pelo seu apelido artístico, já que o de nascença foi Duarte.
A sua voz é única! Delicada, quebrada, entoada com sotaque, frágil e arrebatadora, comovente, esta voz canta belos poemas de Henrique Rêgo e Fernando Teles. Acompanham-no, entre outros, os mestres Carvalhinho e Chainho. Não era fácil fazê-lo, pois Marceneiro era imprevisível, alterando métricas, improvisando, encurtando ou alongando compassos, deixando guitarristas e violas inúmeras vezes em situações emergentes.
É mais do que justa esta minha pequena contribuição para a divulgação deste artista gigante, mas ainda desconhecido para muitos.
Atrevo-me, de quando em vez, a cantar um dos seus mais belos fados e que foi escolhido para abrir esta breve colectânea, O Pagem. Foi também a minha selecção e que incluo na Minha Caixinha de Música para vossa atenta audição.
Silêncio que se vai cantar o fado...

quinta-feira, 28 de junho de 2012

Karim Baggili Quartet - Cuatro Con Cuatro


Nasceu belga e com descendência jordana e jugoslava. Diz mais a sua biografia que é um autodidacta do alaúde.
Começou nas cordas com a guitarra eléctrica, aprendeu a técnica da guitarra flamenca e quando foi às suas origens árabes encontrou o afecto por esse velho e fascinante instrumento.
A música de Karim passeia-se por pátios andaluzes, estende-se pelos áridos planaltos das arábias, serpenteia pelas cordilheiras balcânicas, envolve-se de toques ocidentais e ainda navega por alguns ritmos latinos.
Fui atraído para este disco através da audição dum clássico nele incluído e que já ouvira em diversas vozes e numa miríade de arranjos. Trata-se de La Llorona de Chavela Vargas que Joan Baez, Lila Downs e a minha eterna amada Lhasa de Sela cantaram, entre tantos outros. Foi, no entanto, nos longínquos anos 60 que escutei, pela primeira vez, esta canção deliciosa numa versão mediocremente pastiche que roçava o ridículo, interpretada por António Calvário.
A abordagem de Karim ao tema é sublime e honra bem a autora desta alegoria a uma das grandes lendas fantasmagóricas da América latina.
O álbum é predominantemente instrumental e as poucas incursões da voz, como no tema referenciado, são de extremo bom gosto. A ouvir sem moderação.

terça-feira, 5 de junho de 2012

The Dirty Dozen Brass Band - Funeral For a Friend


Vinte e sete anos vão desde a fundação da banda até à edição deste álbum e trinta e cinco até aos dias de hoje. Para trás ficaram mais de uma dezena de discos, com o último a ter saído no pretérito mês de Maio.
A DDBB poderia ser mais uma banda de rua de Nova Orleães, mas foi e vai mais longe, abrangendo diversas formas e estilos, revelando uma sonoridade ainda mais rica, consequência de tantas fontes. 
Foi nesta liberdade de procura que a DDBB edificou a sua estrutura, o que lhe valeu sobressaliente reconhecimento.
Percorrendo as faixas, da primeira à última, vamos deparar-nos com abordagens ao gospel, ao jazz, à soul, ao funk, ao R&B, sempre bem dentro do espírito da banda de rua destinada às celebrações populares. Mas, aqui e ali, outras influências podem suscitar agradável surpresa.
Aos trombones, trompetes, saxofones, sousafones (esses imponentes instrumentos idealizados por John Philip Sousa) e percussões, foram ainda adidas uma guitarra e o acordeão do sempre imprevisível David Hidalgo. 
Os Davell Crawford Singers aparecem sempre que o gospel entra na festa.
O disco é dedicado ao tubista e deles amigo Anthony "Tuba Fats" Lagen, falecido logo após a sua gravação.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Niño Josele - Paz


Descobri Niño ao ouvir o soberbo álbum Mi Niña Lola de Concha Buika. A par de Javier Limón, um rapaz da mesma idade, ajudou-a a erguer uma obra notável. 
Josele é um guitarrista andaluz da nova vaga de músicos que rondam esse símbolo grandioso da cultura espanhola que é o flamenco. Só quando escolhi este disco para incluir nesta minha página e andei a vasculhar a net à procura de informação sobre ele é que fiquei a saber que já actuou ao lado de gente famosa como Elton John, Lenny Kravitz ou Alicia Keys. Quem diria...
Foi, no entanto, no flamenco que evoluiu e dividiu estúdios e palcos com Paco de Lucia, Duquende, Enrique Morente ou Diego El Cigala.
Este seu álbum de 2006 é uma obra diferente, onde aborda o jazz de forma singular, prestando tributo a um dos seus maiores representantes e a um dos meus preferidos. É aqui feita a recriação de vários temas fulcrais de Bill Evans e a sua transposição para a guitarra. Não seria, à partida, tarefa fácil, dada aquela harmonia peculiar, envolvente e doce do piano do músico ímpar que lhe serviu de inspiração. O que daí resultou decerto agradaria ao ilustre autor.
Tal como o título sugere, este é um momento de grande serenidade e beleza infinita, ideal para quem procura paz ou que bem nela se sente.
Aproveito a ocasião para, através deste tributo, homenagear o músico brilhante que recentemente nos deixou com tanto ainda por fazer.
À memória eterna de Bernardo Sassetti.

Paz

terça-feira, 8 de maio de 2012

Cankisou - Gamagaj

A banda teve origem em 1999 e foi formada por gente ligada ao rock. Não foi, contudo, por essa via que se viriam a destacar. Foi preciso enveredarem por outros caminhos musicais para solidificar um projecto bem engendrado.
Não me peçam para definir o que são, o que tocam e que estilos praticam. Têm mesmo que ouvir e tirar as vossas próprias conclusões, se é que o vão conseguir. Eles intitulam-se como uma banda de fusão étnica.
Há por aqui a base rock, confundida com sonoridades ska, indianas, mongóis, sempre envolvidas por metais caracteristicamente balcânicos e com a saliência da voz poderosa do seu vocalista.
Uma dúzia de anos depois e com cinco discos de originais editados, estão no patamar superior da sua carreira e a entrar nos cartazes de inúmeros festivais de música.
Estes checos endiabrados fazem questão de referir que não usam loops, samples ou quaisquer outros efeitos electrónicos. É tudo energia pura e pela minha parte, neste contexto, não vejo que falta fariam.


Gamagaj

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Andy Palacio & The Garifuna Collective - Wátina

Mais do que um músico brilhante, Andy Palacio foi um divulgador do seu pequeno país e da sua peculiar cultura. Natural do Belize, antigas Honduras Britânicas, território encravado entre o México e a Guatemala, cantou na língua garifuna, um dialecto com misturas de francês, espanhol e doutros caribenhos. 
A sua sonoridade está prenhe de elementos das cercanias. Vislumbram-se a cada passo, sons dos países já citados, mais outros de Cuba, da Jamaica e até dos Estados Unidos. A unir todas estas combinações, está sempre, latente ou manifesta, uma doce tonalidade africana.
Foi embaixador cultural, agraciado pela Unesco e galardoado pela sua música e pela sua actuação cívica.
Esteve anunciada a sua presença no Festival de Sines, na sua edição de 2008, naquele que seria o seu primeiro concerto em Portugal e onde iria apresentar o seu último disco, este que aqui vos deixo.
Em 19 de Janeiro desse mesmo ano, viria a sucumbir a um forte avc, despedindo-se prematuramente de todos quantos amavam a sua música e o seu exemplo de vida. Tinha apenas 47 anos de idade.
Ouçam uma música diferente e façam deste meu singelo tributo uma forma maior de o homenagear.

quarta-feira, 11 de abril de 2012

The Rustavi Choir - Georgian Voices

É sabido o meu particular fascínio pela voz, a solo ou em grupo. Este coral caucasiano já existe desde 1968 e foi a concretização dum projecto de Anzor Erkomaishvili, cantora e investigadora georgiana. O seu intuito era o de quebrar limites étnicos e agrupar todo o folclore tradicional das antigas tribos da Geórgia. O canto é a capella, sintetizando em nove elementos o que normalmente era cantado por grandes grupos corais. 
Estamos perante música influenciada pelas culturas europeias e asiáticas, já que o istmo as separa, mas também as une. Persas, romanos, árabes, mongóis, turcos ou russos, todos por ali passaram e de algum modo lá deixaram as suas marcas indeléveis.
A polifonia é baseada em três vozes repartidas pelos nove elementos do coro. Pontualmente surgem acompanhamentos de cordas de instrumentos tradicionais como o chonguri ou o phanduri. Apesar de arcaicos, estes cantos revelam uma modernidade insólita que despertou o interesse de Stravinsky.
A selecção de temas que compõem o álbum é da própria Anzor e do britânico Ted Levin e foram retirados da antologia 100 Georgian Folk Songs.
Os temas escolhidos incluem canções de trabalho, de festividades várias, cânticos litúrgicos e outros relacionados com o quotidiano popular.
Já com mais de vinte anos de edição, este é um disco intemporal e fundamental para a história da música popular euro-asiática.



quinta-feira, 22 de março de 2012

L'Ham de Foc - Cor de Porc

Assaz importante, este último álbum que editaram antes da sua dissolução em 2007. Estiveram em Portugal, no Festival Med de Loulé, nesse mesmo ano.
O núcleo duro da banda era formado pela dupla Mara Aranda e Efrén López, multi-instrumentistas e compositores valencianos.
É perfeitamente notória a influência do mar no efeito final da música que produzem. Pequenas e grandes impressões tónicas oriundas das culturas banhadas pelo Mediterrâneo, podem ser claramente referenciadas ou subtilmente observadas.
Num périplo iniciado em Valência, seguindo pelas costas de Marrocos, Argélia, Tunísia, Egipto, Líbano, Síria, Turquia, Bulgária, Grécia, Itália e França, chegamos de novo a Espanha bem providos de toda a miríade de sonoridades, inclusive de outras bem mais longínquas. 
Mistura-se a gaita galega com o saz turco, a sanfona com a tabla, o bendir com a tampura e mais uma porção vasta de encontros mais ou menos expectáveis.
Mara e Efrén continuaram separadamente as suas carreiras, mas ainda não tive ocasião de consultar as manobras que desde aí encetaram. Por muito proveitosas que sejam, não tiram o sabor a pouco que o legado da banda deixou.

quarta-feira, 7 de março de 2012

Eneida Marta - Lôpe Kai

Está previsto que o seu novo disco seja editado no decorrer deste ano, conforme pude ouvir pela sua própria boca, numa pequena entrevista dada na RTP-África. São mais de dez anos de carreira que já leva, apesar do seu conhecimento em Portugal ser minguado.
Este é o seu terceiro álbum, saído em 2006, editado em França e que ditou a sua maior exposição internacional. Com a sua inclusão na programação oficial da Womex 2008, o futuro estaria consolidado.
As suas colaborações com outros músicos de díspares origens são também sintomáticas da qualidade que emana. Rui Mingas, Manecas Costa ou Uxia são exemplos do que atrás referi.
Nasceu na Guiné-Bissau mas tomou Portugal como sua casa e seu local de trabalho. As suas biografias indicam que se move por vários ritmos africanos. No entanto, não será difícil de descortinar, aqui e ali, outros elementos do gospel americano ou porções jazzísticas.
A amostra que disponibilizo foi premiada e incluída na compilação "Acoustic Africa" da Putumayo. Enquanto não chega o seu novo trabalho, aqui vos deixo um pretexto para aguçar apetite das novidades que estão para vir.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Radicanto - Lettere Migranti


Os Radicanto falam-nos de migrações através de composições de raiz com o aproveitamento de cartas de emigrantes italianos e respostas de amigos e familiares.
São passados trazidos para o futuro, para não deixar morrer a lembrança dos que fugiram à fome e à miséria, deixando tudo para trás, família e terra.
Tal como nós, portugueses, os italianos partiram para a América e para África em busca de vidas melhores.
São cartas de sofrimento, de saudade e, muitas vezes, de despedida. São pequenos trechos que os Radicanto musicaram em homenagem àqueles que foram em viagem para o desconhecido, num tremendo misto de esperança e temor.
A sonoridade que envolve todo o disco vem das correntes mediterrânicas, sempre ricas e cálidas, onde o bandolim das tarantelas encontra o bouzouki das rebetika (tradicionais gregos).
Mas apesar de ser uma obra evocativa desses tempos difíceis, não é de longe, nem de perto, um álbum triste. Ouçam e confirmem.

Radicanto

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Lhasa - La Llorona

Reposição de post que estava escondido sem disso me ter apercebido. No passado dia 1 de Janeiro já fez dois anos que partiu, para nossa eterna saudade... 


Nunca se falou tanto de Lhasa como agora, a capital do Tibete. Foi nela que os pais desta se inspiraram para a apelidar. Nascida em Big Indian, estado de Nova Iorque, com ascendência mexicana, panamiana, polaca, francesa e espanhola pela parte do pai, libanesa, escocesa e judia russa pela parte da mãe!!! Nómadas por opção, viajando pelos Estados Unidos e México, pais e três filhas foram vivendo sobre rodas, uma vida que muitos sonham para um relativo tempo, mas que poucos assumem com intrepidez para padrão existencial. Lhasa de Sela escolheu o Canadá para iniciar a sua carreira musical. Depois juntou-se às suas irmãs, em França, para se devotar às artes circenses. Em 2001 encontrei num jornal uma referência bem elogiosa ao seu primeiro álbum a solo, este que ora vos deixo. Sem sequer o ouvir, arrisquei a encomenda. O instinto não me ludibriou. La Llorona mistura tradicionais sul-americanos com originais bebidos da música mexicana. Outro dos discos que guardo na minha montra de oiro. Voz profunda, dorida, lamentosa, mas luminosa e quente. Tive o grato prazer de assistir a um concerto seu e só posso dizer que foi um dos melhores do meu currículo. Quanto à fidelidade sonora, não tenho dúvidas, o melhor! Com a ajuda agradecida de Vasco Sacramento (Sons em Trânsito) traduziu a apresentação do espectáculo para português, ajudando todo o público a embrenhar-se graciosamente no encanto das suas palavras e música. Soberbo!!!



segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Amal Murkus - Amal

Comecemos então o ano com música oriunda do Levante.
Amal é palestina tendo optado por viver em Israel para aí se dedicar à divulgação da música e da cultura do seu território natal. Cantora, actriz e polivalente em áreas de intervenção social e política, tem sido reconhecida em todas essas valências com prémios e aplausos um pouco por todo o mundo.
Este seu primeiro disco reflecte todas as suas influências que vão do folclore palestiniano, às músicas dos países banhados pelo Mediterrâneo, passando por algumas alegorias mais ocidentais. No caso patente do trecho que deixo como aperitivo na Minha Caixinha de Música, Amal penetra nos blues, no funky e no improviso, para nos brindar com aquelas misturas de saudável promiscuidade de que tanto gosto. Os arranjos e a produção atingem gabarito superior no acoplar à sua emotiva e bela voz.

sábado, 31 de dezembro de 2011

O Melonauta 2011

Mais um ano de músicas, discos, concertos e muita descoberta. É desse viajar diário pelo universo dos sons que reuni alguns pontos de roteiro. Nunca poderia caber tudo, pelo extenso do percurso e pela falta de tempo e modo. 
Aproveito para desejar a todos os meus visitantes um Novo Ano pleno de realizações, de Amor e de muita música do mundo, deste mundo que deveria ser bem diferente daquele que nos querem impingir a todo o custo.
Até amanhã!

O Melonauta

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Siba e a Fuloresta - Toda Vez Que Eu Dou Um Passo O Mundo Sai Do Lugar

Este disco é o resultado do encontro de Siba Veloso, um dos mais interessantes músicos da música popular  brasileira contemporânea, com um grupo de cantores e instrumentistas, de várias idades e intérpretes da mais pura das tradições da Mata de Pernambuco. Biu Roque era quem mais se destacava pela voz e pelo espólio musical de que era portador.
Vou explicar a ligação peculiar que tive com esta gente, deitando mão a um texto que enviei para uma página da Karina Buhr, cantora, compositora, percussionista e actriz, que já conhecia da banda Comadre Fulozinha.
Rezava assim:
Olá Karina.
Ao saber da morte de Biu Roque encontrei este seu espaço e a magnífica homenagem que aqui lhe presta.
Sou de Portugal, duma cidade chamada Aveiro e tive o privilégio de o conhecer pessoalmente. Vou contar como foi.
Siba e a Fuloresta já visitaram o nosso país por mais que uma vez para apresentar os seus espectáculos e o meu filho trabalha na agência que os representa aqui. Em Julho/Agosto de 2008 eles estiveram no Festival de Músicas do Mundo de Sines na Casa da Música do Porto e como tinham alguns interregnos entre as datas dos concertos, optaram por ficar hospedados em Aveiro e ao abrigo do meu filhão, de quem eles muito gostam. Um dia o meu filho perguntou se arranjava jantar para mais sete ou oito pessoas, coisa simples para pessoas simples. Eu disse que sim, como é óbvio, e nessa noite tive a grata surpresa de ter os Fuloresta a comer um churrasco no meu logradouro. Siba tinha viajado para a Alemanha para um evento de um outro projecto seu e Biu estava doente, tendo ficado no Brasil. Levaram os instrumentos com eles e depois do jantar brindaram-nos com Maracatus e Cirandas que soaram alto na pacatez do meu bairro. A minha mulher teve que pedir desculpa à vizinhança pelo inusitado da situação. Foi um serão único e inolvidável.
No ano passado eles voltaram e desta vez Siba e Biu estavam também presentes e embora não tivessem trazido os instrumentos, a festa não faltou.
Sentei Biu numa das cabeceiras da longa mesa, pois desta vez éramos bem mais, contando com a família, músicos e membros da agência. Desde que chegou até que partiu, Biu só calou o seu canto para comer ou beber. Impressionante! Cantava para ele, cantava para Siba, cantava para todos, ignorando se o estariam a ouvir, sempre naquela voz aguda à beira do colapso.
Em conversa com Siba confiei-lhe a minha admiração por aquele velhote de aspecto frágil que transportava um cancioneiro gigante com ele. Uma enciclopédia viva da música tradicional brasileira.
A falta de instrumentos não impediu que todo o mundo acompanhasse Biu com vozes, palmas, talheres, copos ou com o tamborilar dos dedos.
No final da noite, amparado por Siba que se manteve sempre por perto, agradeceu de forma sentida por tê-lo recebido na minha casa e pelo jantar. Fiquei apreensivo pela sua fragilidade, mas não esperava que o desenlace se desse menos de um ano depois.
Uma noite bonita para lembrar sempre!
Karina, o seu contributo para a dignificação deste músico fabuloso é de louvar e agradecer. Os brasileiros só terão a ganhar em conhecer a música de Biu Roque e o património que consigo transportou.
E agora, se me der licença, vou ouvir o seu novo disco que, confesso, desconheço!
Na cantiga que deposito na Minha Caixinha de Música, podem ouvir a voz principal de Siba e, sobressaindo no coro, a voz sempre no limite do estilhaçar de Biu.
Um disco e duas noites que guardo no cofre dos eleitos.