segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Ildo Lobo - Nós Morna

Na época em que se vivia o estoiro do pop-rock feito em Portugal, passava nas rádios um grupo de fusão chamado "Os Tubarões", cujo álbum "Tabanca" foi sucesso de vendas. Ildo era o seu vocalista. A banda manteve-se em actividade desde 1976 a 1994. Mas dois anos depois Ildo grava este disco soberbo, onde se entrega de alma e coração.
Ele é a voz da Morna, ele é a Morna! Ele interpreta como ninguém, com o seu canto expressivo e cálido, a dolência e o gemido desta forma musical de Cabo Verde.
Ildo Lobo é um daqueles músicos que nos entram pelos sentidos adentro, sem qualquer licença, e nos arrepia com a sua arte.
Nascido no mesmo ano em que eu nasci, pregou-nos a partida de ir embora mais cedo do que a sua imensa vontade de viver pedia. Esta é uma pequena forma de lhe dedicar o meu humilde tributo.
Descobri há bem pouco que, paralelamente, exercia uma actividade profissional similar à minha. Coincidências...

Ildo

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Trio Bulgarka - The Forest Is Crying

Ficaram com proeminente reconhecimento pela sua participação no marco da world music, Le Mystere des Voix Bulgares. Oriundas de várias regiões da Bulgária, conseguiram unificar as sonoridades características de cada uma delas e criar um som próprio e encantatório. Foi a sua aparição junto de personalidades como Kate Bush, ou a referência à sua música pelo beatle George Harrison, que me despertaram para este disco. Vi-as e ouvi-as há já quase vinte anos, num programa de televisão e fiquei estarrecido, magnificamente estarrecido!
Pelo que sei, e já com uma idadezinha muito apreciável, ainda vão andando cantando e em 2007 chegaram a actuar com os Trans Global Undergrond.
Para quem, como eu, é apaixonado pela música coral, vai com certeza ficar seduzido pelas polifonias, pelo cromatismo dessas vozes de excepção e pelas melodias que interpretam.

Trio

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Four Men & A Dog - Shifting Gravel

Esta banda irlandesa que teve o seu maior reconhecimento na década pretérita, continua em actividade e lançando novos trabalhos em disco, mas dela só conheço este álbum que aconselho vivamente. Não é uma banda purista, na acepção da palavra, pois contamina as raízes da música irlandesa com sonoridades de bluegrass, country e algum mainstream, tendo também em alguns outros trabalhos, segundo o que li, abordado o jazz, a salsa e o rock. Bastante eclécticos, os rapazes. Para melhor entendimento convém ouvi-los e apreciar como conjugam em perfeição, guitarras e acordeões, violinos e banjos, pianos e percussões. Acrescentem um "pedal steel" e as vozes e o complexo sonora está pronto a ser servido.
Um Irish Coffee e um Bourbon, já agora...

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Vinicius Cantuária - Horse & Fish

Vinicius é um ilustre desconhecido que iniciou carreira na onda progressiva do rock, para alguns anos depois se interessar por vertentes menos óbvias, tendo optado por ir viver para os Estados Unidos. Foi por aí que se começou a embrenhar no Jazz e em cenas alternativas da música mais à frente. Trabalhou com Brian Eno, Laurie Anderson, Arto Lindsay, Bill Frisell, David Byrne e Ryuichi Sakamoto, entre outros. Nunca esqueceu as suas raízes e a prova disso é este disco onde mais de metade é dedicada à Bossa Nova. Não é um purista, claro, mas as novas roupagens com que veste a sua música só lhe emprestam um novo encanto.

Horse

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Kékélé - Congo Life

Sabiam que existia a rumba congolesa? Congratulações, se sim. Se não, estão nas exactas condições em que me encontrava antes de ouvir este disco deveras surpreendente para quem julgava que a rumba só era cantada e dançada nas Caraíbas. Para quem gosta de música africana e para quem gosta da música que se ouve lá pelo meio dos furacões. Composto por músicos com grande experiência, com trinta e quarenta anos de carreira em separado que se juntaram para criar este supergrupo que nos brinda com uma mistura de primeira. Ouvir os instrumentos e os sons peculiares dos dois extremos do Atlântico torna-se uma experiência deliciosa. Mas é rumba, disso não há a menor dúvida!
Congo Life

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

José Mário Branco - Resistir é vencer

Desde que o conheço, desde "Mudam-se os Tempos, Mudam-se as Vontades" de 1971, que o guardo como uma das minhas referências no plano da concepção artística e dos arranjos que faz para a sua música e para a dos outros. A figura romântica de lutador e resistente aos ditames retro-sociais e hipócritas também me fascina de alguma maneira.
No período pré 25 de Abril de 1974, ao lado de Fausto Bordalo Dias, Sérgio Godinho e claro, José Afonso, foi um dos pilares que me suportou junto à música portuguesa, quando grande parte da juventude da época se alinhava pela música anglo-americana.
Um dos melhores discos de 2004, obra maior e imperialmente ignorada pelos media, como aliás é o hábito inditoso a que estamos destinados.
A dedicatória por ele inserida no disco é bem o retrato da sua personalidade:
- "O título RESISTIR É VENCER, lema da luta do povo de Timor-Leste durante a sua resistência de 25 anos ao exército indonésio, foi escolhido à luz da percepção, adquirida durante uma estadia nesse novo país, de que ele ultrapassa, e muito, a mera palavra de ordem política. É um lema ético que assenta bem àqueles que, sendo poetas ou criadores artísticos, travam uma luta dura, desigual e ininterrupta contra os seus próprios limites e os do mundo que os rodeia. É porque a história, o discurso e o coração dos resistentes timorenses me ensinou isto que eu lhes dedico este álbum de canções."

Resistir

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Tuxedomoon - Cabin In The Sky

Banda americana com quase 30 anos de existência, com menores e maiores hiatos e actividades paralelas dos seus componentes. Saídos da cena pós-punk e new have, sempre se propuseram navegar por vários quadrantes, da pop ao jazz de fusão, do experimentalismo electrónico às performances multi-disciplinares ao vivo.
Assisti ao concerto de lançamento deste disco e para quem como eu desconhecia o trabalho do grupo, foi uma grata e deslumbrante surpresa. Ambiência, sonoridade, luz, côr, movimento plástico em doses de inequívoca elegância e experimentação.
Diferente e absorvente!

Cabin

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Lura - Di Korpu Ku Alma

Depois das sempre curtas férias, o retorno aos trabalhos...
Uma portuguesa, nascida em Lisboa de pais de Santiago, cantando Cabo Verde sem ter lá vivido, utilizando um dialecto como se fosse a sua língua natal.
Maioritariamente repartido por Lura e Orlando Pantera nas composições e por músicos conterrâneos nos vários instrumentos, revela-se um disco luminoso, fresco e de embalo contagiante que retrata bem o país que adoptou para expressar a sua musicalidade.
Por altura do seu lançamento, tive a oportunidade de ver uma entrevista sua na televisão, ainda desconhecedor da sua arte, e fiquei inquieto na sua busca. Um pouco mais tarde, sofri um revés na sua apreciação ao vislumbrá-la de passagem num episódio dos inenarráveis "Morangos com açúcar", mas pelos vistos tratou-se apenas de um pequeno e lamentável acidente, depressa remediado...
Tal como o título diz, este é um disco feito com muita alma, em que amiúde o corpo não resiste.

Lura

quarta-feira, 13 de agosto de 2008


ENCERRADO PARA FÉRIAS


sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Ani DiFranco - Evolve

Em 1999, Ani editou três álbuns, um deles em parceria com Utah Phillips, e todos sujeitos a apreciações abonatórias da crítica. Desconhecida para mim, logo tratei de procurar abeirar-me dos seus então mais recentes trabalhos e iniciei-me com To The Teeth. Andava eu, por essa altura, a navegar na Indie e na alternativa e aquilo veio na hora certa.
Peculiar, persistente e produtiva, são adjectivações que se lhe colam na perfeição.
Cedo se ligou às causas feministas com ardente empenho e as suas canções são um espelho disso mesmo. Por elas passam temas como o aborto ou a violação e sem mostrar estandarte, Ani nunca escondeu a sua bissexualidade.
Criou a sua própria editora, foi nela que lançou o seu primeiro disco em 1990 e desta forma independente se manteve até hoje.
A sua voz é versátil e colocadíssima, capaz de articular sem atropelar. A sua forma de tocar guitarra é distinta e baseada no fingerpicking, com harmonias ora céleres, ora delicadas e a sua música poderá definir-se como folk-rock alternativo.
Este seu disco é muito jazzy, funky e considero ser uma óptima montra das suas generosas capacidades. A amostra que vos deixo na minha Caixinha de Música, é o mais básico dela, voz e guitarra. Façam um pequeno exercício, imaginem a colocação sequencial de baixo, bateria, teclas, sopros e ficarão com uma produção própria a deambular na cabeça. Será que se harmonizará com a produção de Ani? Comparem!

Evolve

quarta-feira, 30 de julho de 2008

El Bicho - El Bicho

A par dos Ojos de Brujo, são das bandas mais atractivas no panorama vastíssimo da música dos nossos vizinhos espanhóis. Gente muito nova, mas com muito talento. Ostentam uma mescla de flamenco, rumbas, tangos, jazz, rock, pop e ritmos afro-latinos.
Ao vivo demonstram uma animação demolidora e mesmo algumas acrobacias algo exageradas do seu cantor e mestre-de-cerimónias, não chegam para deslustrar o brilhantismo do colectivo.
Para ouvir agora e ver na próxima oportunidade.

El Bicho

terça-feira, 29 de julho de 2008

Robert Wyatt - Cuckooland

Estamos perante um músico de árdua catalogação. Desde os anos 70, em que integrou os Soft Machine, banda que aliou o rock progressivo ao jazz, até aos nossos dias, Robert sempre manteve uma fértil e bem interessante carreira. Confinado, desde 1973, a uma cadeira de rodas, resultado de uma noite de excessos e a uma queda de um 3º andar, nem por isso a sua força de viver e de fazer música se desvaneceu. Continuou a tocar o seu instrumento, a bateria, apurou-se noutros, como o piano e a trompete, e compôs canções para quase uma quinzena de álbuns. Interessou-se por outras músicas e outras culturas, tocou com gente como Fred Frith, Mike Oldfield, Carla Bley, Phil Manzanera, Ryuichi Sakamoto, David Gilmour, Elvis Costello, Sting e Björk.
A sua música é de uma delicadeza atroz, simples e intrincada em simultâneo. E a sua voz de múltiplas oitavas é um desfiladeiro de emoção que parece querer transportar-nos ao seu âmago mais secreto.

terça-feira, 22 de julho de 2008

Oumou Sangaré - Worotan

A grande embaixadora do Mali musical, lutadora pelos direitos da mulher africana, especialmente coarctados naquela região do mundo. Conjugando a dolência com o festejo, a amargura com a perseverança, misturando uma plêiade de músicos e instrumentos, atinge uma diversificada teia de ambientes, onde os djembe, os bolon e as cordas dão o mote. À sua vez, seguem-se sopros e percussões. E depois as vozes, em coros polifónicos de bonita e singela coadjuvação.
Oumou é também conhecida pelo "pássaro cantor de Wassoulou" (histórica região a Sul do rio Níger) e a sua música vai beber às fontes profundas das tradições e dos rituais de caça do seu povo.

Worotan

sexta-feira, 18 de julho de 2008

Dervish - Spirit

Já com duas décadas de existência, os Dervish são uma das mais estimulantes e virtuosas bandas irlandesas. Basicamente dedicados aos tradicionais celtas, atrevem-se esporadicamente na composição e na reconversão de alguns temas de autor. Sinceramente, prefiro as suas interpretações bem urdidas e irrepreensíveis dos primeiros. É aí que o grupo se movimenta como peixe na água e nos presenteia com pedaços brilhantes da tradição.
A capa parece um outdoor publicitário de um destino turístico, mas o conteúdo, acreditem, é bem melhor.
Estiveram recentemente em Coimbra, como atracção, no festival Eurofolk'J. Quem lá esteve e assistiu pode e deve dizer aqui de sua justiça. O infotório agradece!

Spirit

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Sigur Rós - Ágaetis Byrjun

A uma primeira audição, em fonte medíocre, com atenção dispersa mas suficientemente desperta, juntei as crónicas elogiosas da época e adquiri este cd para então, com total disponibilidade, nele me embrenhar.
Uma autêntica aventura nos confins dos gélidos mares!
Ainda hoje e sempre que o oiço, a pele se me arrepia, não de frio, mas de pura emoção.
Aconselho, a quem nunca o fez, a ouvir estas e outras músicas na penumbra ou no breu e libertar corpo e alma à corrente dos sons. Não vai ser difícil seguir pelos desertos gelados e pelo mar à volta da recôndita ilha. Lá encontrarão os ventos cortantes do deserto branco e o gotejar dos glaciares.
Uma obra-prima e um dos discos da minha vida!
Não será esta a soul branca?

Agaetis

domingo, 13 de julho de 2008

Natacha Atlas - Ayeshteni

Natacha é mais um daqueles frutos da miscigenação cultural e das paixões que lhe estão intrínsecas. Nascida na Bélgica de mãe inglesa e de pai com derivados marroqionos, egípcios e judaico-palestinos, após a separação destes, passou a viver e crescer na Inglaterra. Cedo começou a pôr em prática as dádivas genéticas, e das incursões na música das caraíbas, às experiências com os Trans-Global Underground, onde se tornou a voz da frente, logo a sua linha de prumo se foi definindo. Aos 35 anos de idade casou com o músico sírio Abdullah Chhadeh e mais se estreitou a rota entre o Oriente e o Ocidente.
Este álbum é um retrato disso mesmo, misturando as raízes de Natacha, as construídas e as herdadas, com as adquiridas na sua vivência europeia.
Esteve em Portugal, no ano passado, na Casa da Música do Porto, mas infelizmente não pude assistir ao concerto. Resta-me o prazer de a ouvir em disco e de a divulgar a quem não a conhece.

Ayeshteni

domingo, 6 de julho de 2008

Buena Vista Social Club Presents: Omara Portuondo

Não foi por negligência, nem por falta de motivação que demorei na actualização do blogue. Este inusitado e involuntário hiato, deveu-se a uma indisponibilidade do tempo de que necessito para manobrar todas as operações exigidas. As informáticas e as cerebrais.
Volto com esta Senhora, verdadeira diva e uma sobrevivente do Buena Vista Social Club. Dispenso as apresentações, pois suponho que um pouco mais ou um pouco menos, já a tenham ouvido. Este é um disco onde preponderam os boleros, pelo meio de outras canções cubanas e até de Gershwin.
Tive ocasião de a ver e ouvir, na sua única passagem por estas terras e foi das noites musicais mais comoventes da minha vida, fruto de uma prestação eivada de um dramatismo que só ocorre algumas vezes e que afecta totalmente um artista.
E como já vai sendo hábito, mais um mojito e outra corona gorda...

Omara

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Susheela Raman - Love trap

Normalmente levo as memórias ao sabor da pena, em devoto silêncio e ganhei a mania de julgar que as lembranças não se perdem, no seu essencial. Mas algumas perdem-se! Quando ouvi este CD pela primeira vez, sei-o agora que estou a revisitá-lo enquanto alinhavo estas letras, não guardei devidamente partes fulcrais com que agora me delicio. Ouço os sons do canto da garganta (throat-singing asiático) e não me recordo de os ter escutado na primeira abordagem. E há ainda outros mares e outros continentes que regressam aos meus ouvidos. A base, essa está intacta, a ponte que leva o ocidente à Índia e o traz de volta, essa mantive-a desde a primeira audição e o muito agradável concerto que dela vi. Foi com fluida versatilidade que encantou, cantando tradicionais indianos, Joan Armatrading ou Tim Buckley.
Vale a pena conhecer esta inglesa, descendente de pais Tamil, dona de uma sensualidade esquiva, de gosto irrepreensível, sempre rodeada de músicos superiores de todo o mundo.
O resultado está disponível para quem quiser ouvir!

Love Trap

domingo, 15 de junho de 2008

Kimmo Pohjonen - Kluster

Se no caso de Cibelle já tinha uma pequena referência que me permitia conjecturar sobre os seus préstimos, de Kimmo apenas sabia que vinha da Finlândia, tocava acordeão e que os seus espectáculos eram de imprevisível duração, chegando a prolongar-se por quatro e cinco horas!
O primeiro contacto foi só...fabuloso e inesquecível!
Homem, acordeão e microfone, fundidos numa mola sonora que vai esticando e contraindo, do estampido ao sussurro. Ao lado, outro homem, Samuli Kosminen, percussionista electrónico, manipulador de todo o som que Kimmo lhe vai doando. Depois é o cenário e a coreografia luminosa de cores de fornalha, e mais aquele vulto que se levanta e senta, se dobra, cai sobre os joelhos, se deita, rebola, rasteja e permanece, rosto para além do cimo, da teia, do telhado, das nuvens pesadas que fecham o céu de Outono, abraçado ao fole teclado de botões, nunca lhe dando tréguas.
O espectáculo não durou mais de hora e meia, contrariando os mais optimistas. No dia seguinte soube que magoara um pé e que teria acabado o concerto em grande sofrimento. Quem diria!
Nem sei definir a sua música com exactidão. Pensem em folk escandinavo, rock do duro, improvisação, avant-garde, e muita, muita experimentação. Depois, é só deitar no shaker...

Kluster

sexta-feira, 6 de junho de 2008

Cibelle - Cibelle

Fui ver um concerto desta menina paulista sem ter ouvido uma única nota mais, para além de um tema deste seu primeiro CD que esporadicamente passava na rádio. Nem sequer lhe conhecia o rosto. Diria que estava perante uma quase desconhecida a quem, timidamente, estava prestes a abrir a porta. E de repente a ombreira se escancarou e a torrente foi invadindo sem pedir licença. Percussões e programações, cuícas e samplings, pandeiros e loops, gira-discos e vozes. Pelo meio, vinham sons de guitarras, melódica, Clavinet, Mellotron, Rhodes, trombone, Wurlitzer, uns tratados e outros singelos. Depois, foi seguir os trilhos e acompanhá-la pelo Jazz, pela Bossa Nova, pela MPB e ouvir como Jobim, por um lado, e a electrónica por outro, nos levaram a passeio por entre as 11 faixas que integram o registo.
Cibelle compõe, toca vários instrumentos, produz e nos oferece em voz bilingue, a sua primeira viagem no mundo discográfico.
E a novata menina se revela um mulherão...em todos os sentidos!!!

sexta-feira, 30 de maio de 2008

Eliza Carthy - Anglicana

Comigo a música funciona assim: ouço, gosto, reservo e mais cedo ou mais tarde, ou por lembrança, ou por associação a um qualquer estímulo, volto a querer ouvir com anseio. Passo anos sem repetir uma audição, mas a todo o momento a memória acende-se. Falei de Eliza Carthy a propósito do post anterior e o reflexo pavloviano irrompeu do nada.
Herdeira de um património de luxo, filha de dois lendários músicos da folk britânica, Martin Carthy e Norma Waterson, não desperdiçou o acaso e partindo desses e com esses legados, encetou uma bonita carreira, cantando e tocando violino e piano.
Este disco celebra o retorno às raízes profundas de que nunca se soltou verdadeiramente, depois de várias experiências à volta do folk-rock e de naturais processos de maturação. Um trabalho inspirado, inteligentemente elaborado e misturando em doses apuradas, a recriação própria com as virtudes da família de novo reunida. O resultado revela-se uma delícia para os sentidos visados.

Anglicana

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Billy Bragg And Wilco - Mermaid Avenue

Da reunião entre o inglês Billy Bragg e a banda norte-americana Wilco, resultou este disco assaz interessante, realizado a partir de algum espólio deixado por Woody Guthrie e nunca antes editado. Assim do velho se fez novo e do passado, modernidade.
Confesso que quando comecei este projecto não tinha intenções de dedicar grande espaço à música anglo-americana, por demais divulgada. Com a revisita às minhas prateleiras, tomei consciência de que há muitas obras que são desconhecidas pela maioria e que são parte da verdadeira essência das culturas que representam. Decidi que não seria justo para comigo deixar estas e outras memórias distraídas ou apagadas.
De regresso ao CD, direi que os protagonistas se rodearam de gente de valor e estatuto reconhecido. Natalie Merchant (10.000 Maniacs, lembram-se?), Eliza Carthy (Waterson: Carthy, conhecem?) e Corey Harris (The Blues, episódio realizado por Martin Scorsese e Sons em Trânsito/05, viram?).
Com o aval deste vosso modesto servidor, embrenhem-se nesta América profunda que, embora baseada em negativos a preto e branco, se revela em cores vivas!

Mermaid Avenue

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Lucinda Williams - Car Wheels On A Gravel Road

Quando na minha apresentação acerto que vou sugerir alguma música de todos os cantos da Terra, não pretendo prescindir, por algum mesquinho preconceito, de nenhum lugar ou de nenhuma cultura. Logo, não há razão alguma para deixar de lado os gigantes anglo-americanos, já que no meio de tanto lixo editorial, existem sempre pérolas enclausuradas nas suas conchas. Lucinda, embora liberta dessa reclusão, continua uma quase desconhecida por esse mundo fora e nem alguns prémios da máquina comercial a levaram ao reconhecimento justo dos seus compatriotas.
Exigência, subtileza de estilo e muita coerência, são condições e alicerces sólidos para a sua obra de quase trinta anos, exibida em apenas oito álbuns de originais. Este é o seu disco mais mainstream e que mais êxito obteve, o que não significa ser um trabalho menor, antes pelo contrário. Chamem-lhe country alternativo, country-rock ou o que bem aprouverem, isto é boa música americana e pode emparceirar com o melhor de Johnny Cash ou Steve Earle, na rudeza e na beleza!

Car Wheels

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Susana Baca - Espíritu Vivo

Este CD tem uma pequena história por detrás, que me me deixou uma terna e indelével marca. A minha Lia, adoradíssima filhota, acabara de entrar no ensino primário e cabia-me a tarefa quotidiana de a levar matinalmente à escola. (Já referi aqui que por essa altura a TSF tinha uma programação musical associada às notícias, da melhor que se praticou neste país.) Uma canção despertou um interesse mútuo, enquanto seguíamos viagem e escutávamos o auto-rádio. Espontaneamente e de altíssima voz, em uníssono, acompanhávamos Susana Baca e o seu Toro Mata. Isto repetiu-se por várias manhãs. Passado pouco tempo, a cantora esteve em Aveiro e a Lia assistiu pela primeira vez a um concerto musical. Teria assistido...se, devido ao tardio da hora e ao cansaço da ginástica rítmica, não tivesse adormecido à segunda música. Valeu que o concerto começou com o...Toro Mata!
Espíritu Vivo tem o tradicional peruano, a abordagem muito pessoal a canções da grande Chabuca, a Caetano Veloso e à sua negritude, ao clássico Les Feuilles Mortes de Jacques Prevert e à pequena maravilha que é The Anchor Song da minha muito querida Bjork.
Uma exortação à vida e aos recônditos das harmonias, gravado em Nova Iorque na semana do 11 de Setembro...

Espíritu Vivo

terça-feira, 29 de abril de 2008

Rokia Traoré - Wanita

Li na imprensa da época (2001), uma referência bem elogiosa a este disco de Rokia, o segundo da sua carreira. Ainda sem acesso aos meios de que hoje disponho, sem ouvir um trecho que fosse, sem o conseguir encontrar nas lojas perto de mim, arrisquei a encomenda ao meu amigo Toné, que, devido à sua profissão, percorre quilómetros sem fim. Comprado em Lisboa, foi assim que o consegui, ainda mais com a grata surpresa de mo terem oferecido.
Um disco belíssimo, uma voz deliciosa, serena e vigorosa, mais o manusear soberano da guitarra. Toumani Diabaté está também presente com a sua magnífica kora.
Nascida no Mali, filha de diplomata, com ele viajou por África, pelo Médio Oriente e pela Europa. As influências de tudo isto colaram-se-lhe no gosto musical e delas fez uso para os arranjos dissemelhantes dos ancestralmente usados na sua cultura originária.
A sua dedicação às causas sociais foi um factor que também me levou ao afecto pela sua personalidade.

Wanita

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Rubén González - Chanchullo

De todos os participantes no Buena Vista Social Club, Rubén será para mim o mais importante de todos. Pelo seu virtuosismo, pela sua sensibilidade e por arranjos únicos, por vezes desconcertantes. Há muito jazz no seu percorrer do piano. Dele afirmou Ry Cooder, após a conclusão das filmagens do documentário de Wenders, "ele é o maior pianista que ouvi em toda a minha vida!" Surpreendente e inequívoca tal apreciação. Não vou adjectivar em grau o meu apreço por esta figura ímpar da música cubana do século passado, preferindo apenas dizer que gosto muito do seu trabalho e da sua arte.
O acaso, essa fortuita sombra que sempre nos acossa, deu-lhe o talento das mãos de artista, mas reservou-lhe uma grave artrite que lhe impossibilitou a magia dos dedos e o teclar do marfim até ao final da sua vida.
Viva Rubén para sempre!
E acenda-se mais um corona gigante!

Chanchullo

sexta-feira, 18 de abril de 2008

Virgínia Rodrigues - Nós

Percurso bem curioso, o desta baiana oriunda de uma favela de Salvador, filha de gente bem humilde. Demorou alguns anos a passar de manicure a cantora, mas o seu desiderato cumpriu-se. Voz singular, entre o clássico e o popular, deu os seus primeiros passos em coros de igrejas. Participou também em teatro musicado e foi aí que Caetano Veloso a veio a encontrar. Já com 30 anos de idade, educa a sua voz numa oficina de canto, num curso livre. Nela incorporam a candomblé, a cultura baiana, a canção de rua, o batuque, Shubert e Verdi. É esse vaguear que esta meio-soprano percorre, que lhe empresta uma luz difusa e resplandecente, não reconhecida noutras vozes do panorama vocal brasileiro. Destaque maior para as contribuições de Caetano e de Celso Fonseca, músico brilhante de quem aqui falarei com outra minúcia em ocasião propícia.

Nós

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Taj Mahal / Toumani Diabate - Kulanjan

Ouvido pela primeira vez na saudosa TSF de outrora, estação radiofónica que aliava a notícia rigorosa com a divulgação de música de grande qualidade, logo fiquei com ele na orelha. Encontros, reencontros, a América e a África, a guitarra eléctrica e a kora. Um disco belíssimo que ainda tem a participação de outros músicos do Mali. Como o próprio Taj escreve, trata-se do completar de um ciclo, do retorno ao intacto original, o concretizar de um sonho mantido por várias gerações de africanos que viveram e vivem para lá do seu continente.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Gaiteiros de Lisboa - Bocas do Inferno

Os Gaiteiros são um dos marcos principais, talvez o maior, de uma forma diferente de encarar, cruzar, criar e interpretar a música tradicional portuguesa. Fazem-no com urdidura inventiva, sem barreiras convencionais, exibindo um saudável experimentalismo e uma divertida glosa sarcástica. Bocas do Inferno percorre o folclore português, de Trás-os-Montes ao Algarve e ainda, em tempo de fuga, descobre escapatórias até Macau, Córsega e Galiza. No meio de tudo isto, veste farda caricatural e com flautas de pan e celofanes, marcha ao som de John Philip de Sousa. Imperdível!

Bocas

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Ibrahim Ferrer - Chepín Y Su Orquesta Oriental

Por muito que editem, reeditem e inventem, nunca será feita a verdadeira justiça, devida em vida, a estes cantores e músicos cubanos, relegados, excluídos e deixados no esquecimento durante décadas. Graças a Ry Cooder e a Wim Wenders, pudemos assistir ao ressuscitar destas fénix e um pouco de equidade foi reposta. Ibrahim surge aqui acompanhado pela orquestra de "Chepín", falecido em 1984, mas continuada por outros mais jovens músicos, e pelos Los Bocucos, outra velha glória cubana. Conhecido pela sua relação estreita com os boleros, remete aqui para um amplo leque, abrangendo a Guaracha (Salsa), o Danzón e os Mambos. E vai mais um puro!

Ferrer

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Fausto - Grande Grande é a Viagem

Fausto Bordalo Dias, será para mim e para todos os que assistiram à sua eclosão artística, sempre e somente Fausto! Um dos músicos da minha geração que melhor aglutinou o tradicional, o rural e o urbano. Sempre tive por ele uma enorme admiração, não só pela sua obra decorrente, mas sobretudo pela magnitude da sua integridade musical. Um exemplo para todos aqueles que pensam que o êxito e o negócio estão na primeira mira! Este CD duplo foi gravado durante os seus concertos no Centro Cultural de Belém, nos dias 9 e 10 de Abril de 1999. Trata-se de um sobrevoo à sua pretérita discografia até à data e aqui ficaram registados momentos únicos na vida de um artista. De forma esparsa mas firme, Fausto não nos deixa à deriva e sempre nos arranja uma nau ou uma simples jangada para dele nunca desacostarmos. Este foi um daqueles concertos que lamento não ter estado lá. Resta-me e a vós também, fechar os olhos, fechar a barra e deixar a viagem correr por todos os nossos canais! Boa viagem...

Grande 1

Grande 2

terça-feira, 25 de março de 2008

Carlos Paredes - Guitarra Portuguesa

Há sentidos, sentidos, que se entrelaçam noutros sentidos, deles se alimentam e a eles se dão. Isto a propósito deste enorme músico português. Tenho que regredir no tempo e voltar aos finais da década de 60, para encontrar as suas primeiras e perenes referências. Estava então na minha inocente adolescência quando me meteram o bichinho do teatro. Logo de uma assentada defrontei-me com dois monstros teatrais: Lorca e Santareno. Foi nos bastidores, lugar onde me sinto como peixe na água, que dei os meus primeiros passos e convivi com homens já feitos, com os seus defeitos e as suas virtudes. Representava-se "O Lugre", retrato dos dramas passados a bordo dos bacalhoeiros na Terra Nova. Foi no velho Teatro da Trindade, em Lisboa, que presenciei um dos mais impressionantes episódios da minha vida. A sala cheia, no final, de pé, vibrante, aplaudindo durante dez, quinze, vinte minutos, não sei ao certo, todo o emocionado elenco. Por detrás dos panos, assisti com olhos marejados, até que alguém me empurrou também para o palco. O aplauso era recíproco e quando dei por mim estava ali bem perto de Bernardo Santareno que entretanto subira os degraus para se juntar a nós. Inesquecível! A sonoplastia deste espectáculo era composta, exclusivamente, por temas de Carlos Paredes...
Para além do extraordinário virtuosismo como compositor e intérprete, criou um estilo novo para a guitarra de Coimbra, maior do que a de Lisboa, alterando-lhe a forma a fim de obter dela uma maior amplitude de acordes e modulações. Citando Alain Oulman, Paredes deu "voz" à guitarra, dando-lhe, acrescento eu, honras de primeiro instrumento.
Porque esta música me toca e me traz remotas e gratificantes lembranças, não a poderia ignorar neste blogue, nem deixar de a partilhar. E foi este Homem, durante toda a sua vida, músico de excepção em todo o Mundo, arquivista de hospital, em Portugal!!!

Guitarra

quarta-feira, 19 de março de 2008

Orquesta Aragon - La Charanga Eterna

Formada por Orestes Aragon Cantero no ano de 1939, primeiro com o nome de Ritmica Del 39, depois como Ritmica Aragon, só no fim de 1940 adquiriu o definitivo Orquesta Aragon. Caracterizada até aos nossos dias pelos violinos e pela flauta, esta charanga começou por tocar, sobretudo, o "danzon", um velho estilo que já vindo do século passado (XIX), conheceu novo fôlego através da variante cantada, a "danzonete". Orestes pretendia fazer da orquestra uma família musical, preterindo a virtuosidade a favor da compartilha de amizades e qualidades humanas dos seus músicos. Uma grave doença ditou o seu afastamento precoce em 1948. Rafael Lay, então com apenas 20 anos, foi a quem ele delegou a responsabilidade do projecto que iniciara. O seu instinto musical não o enganou, pois Rafael não só continuou a sua obra, como levou a orquestra, sob sua batuta, ao reconhecimento internacional. O espírito de Orestes e da revolução manteve-se até hoje. Não há vedetas no grupo e os benefícios financeiros são distribuídos por todos de forma igualitária.
Este CD foi lançado para comemorar o sexagésimo aniversário da banda e engloba visitas ao velho património Aragon, aos clássicos cubanos e novos temas. Colaboram, entre outros, a grande Omara Portuondo, Cheo Feliciano, legenda da salsa, o congolês Papa Wemba e o antigo cantor da Orquesta, Felo Bacallao.
Vamos então beber um mojito, acender um puro exquisito e ouvir a charanga eterna!

Aragon

quarta-feira, 12 de março de 2008

The Chieftains - Santiago

Os Chieftains são uma verdadeira instituição! Quase que me atrevo a chamá-los de Organização Não Governamental de preservação, divulgação e ligação da música celta, através de percursos por várias latitudes, às vezes até fora do conceito e da localização. Este seu trabalho é-me muito querido, já que se atrevem na fronteira, aproveitando os caminhos que vão dar ao apóstolo, vindo saborear sons lusos e acrescentando Júlio Pereira ao rol de grandes músicos a que fazem questão de se reunirem vastas vezes. Entram assim pelo Norte de Espanha, vão ao México com Los Lobos, a Cuba com a mãozinha de Ry Cooder, até às praias da Nazaré, deixam o Minho para trás e acabam a noite num pub irlandês em Vigo!

Santiago

sexta-feira, 7 de março de 2008

Pias - O Cante na Margem Esquerda

Desde garoto que tenho uma admiração quase inata pelo cante alentejano. Talvez uma das razões porque me viria a apaixonar, já homem bem maduro, pela terra, pelo cheiro, pela planície, pelos comes e bebes e pelas suas gentes. No boocklet pode ler-se: "...O folclore genuíno do Alentejo não é dançado, nem tocado, mas apenas cantado. Aparentemente monótono e de pouca alegria exterior, é no entanto nostálgico, dotado de uma devotada profundeza de alma e de uma invulgar riqueza polifónica..."
O cante, aqui interpretado pelos Camponeses de Pias, que tiveram a preciosa ajuda de Vitorino Salomé, são o retrato fiel dessa majestosa polifonia, de harmonias bem características e métrica única. Do melhor e mais rico que a música folclórica portuguesa nos deixou como legado e que urge preservar, divulgar e porque não...cantar, como já o fiz, à volta duma chouriça assada e dum tinto animador!
Desculpem a qualidade da capa, mas como não tenho (que vergonha!!!) hardware para a digitalizar, tive que obter uma imagem da net...

O Cante

terça-feira, 4 de março de 2008

Hedningarna - Trä

Não foi de fácil digestão, a primeira toma desta poção diabólica. Não pelas origens misturadas, algumas quase castas aos meus ouvidos, mas pelo vigor e pela abundância. Os impactos inusitados e as reviravoltas de vozes e instrumentos fizeram com que, de forma progressiva, passasse a adorar este trabalho. Folk escandinavo engrenado com rock musculado e adornado de vozes femininas angelicais. Sons instrumentais pela primeira vez escutados, pois vários dos aparelhos utilizados foram reconstruídos e reinventados com base em destroços e espólio de museologia.
Tal como o velho slogan, primeiro estranha-se, depois entranha-se...
Mesmo uma dezena de anos depois!

Trä

sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

Hector Zazou - Chansons des Mers Froides

Hector Zazou é um alquimista dos sons, umas vezes bem sucedido, outras nem tanto.
A abordagem que aqui faz à paleta sonora dos países banhados pelos gélidos mares é de uma áspera doçura que nos deixa muitas vezes entre o repelir e o abraçar. São as virtudes, as distinções bem próprias dos desertos gelados. Partindo da Finlândia e arribando à Groenlândia, passando pela Sibéria e por Hokkaïdo. Há melodias de uma beleza austera e terrificante.
A par de nomes que até então desconhecia, encontrei os de quem muito gosto, como Björk, Värtina, Suzanne Vega, Jane Siberry e Siouxsie.
Trata-se de, na sua maioria, música tradicional com arranjos de Zazou, onde a electrónica servida fria, acompanha de forma soberba.

HZ



terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Ingrid Karklins - A Darker Passion

Entre Riga e o Texas. O folk letão à mistura com linhagens artsy da pop e de outros folks.
Uma curta passagem pelas músicas que deixou sabor a pouco. Tantos canastrões e canastronas a arrastarem-se e a definharem de disco em disco por aí e pequenas jóias como esta que se perdem no tempo e na voracidade do consumo!
Há por vezes um belo e inquietante perfume que cheira a Laurie Anderson, que só abona em seu favor. Não sei o que a levou a abandonar esta faceta que lhe ficava tão bem, mas foi pena.
Aqui vos deixo uma boa lembrança de 1992, de uma sonoridade perdida.

A Darker Passion

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Planxty - Cold Blow and the Rainy Night

Ironicamente, alguém os apelidou de "a 1ª super banda irlandesa". Porém, um super grupo está sempre ligado a fama, estrelato e bastante dinheiro. A primeira foi pouca, o segundo foi miragem e o terceiro, ao que consta, ficaram mais a devê-lo do que a recebê-lo. Quando surgiram, no início da década de 70, a minha atenção andava, quase em exclusivo, dirigida para o rock e as suas ramificações. Não era fácil estar disponível para escutar uns malucos que andavam a mexer nas tradições musicais do século XVIII. Havia bandas de folk que me fascinavam, e dou como exemplo os ingleses Fairport Convention, mas da Irlanda não me chegava nada. Foi só em 1993, vinte anos depois da edição deste disco, que dei de caras com a música deste grupo que ainda tentou novas reuniões sem resultados idênticos aos conseguidos inicialmente. Mais vale tarde que nunca...
Cold Blow

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Cesária Évora - Mar Azul

A diva dos pés descalços ainda longe dos holofotes do êxito. As noites de Cabo Verde na voz desnuda, cantando como quem respira, por entre fumo e bebida. Os músicos que a acompanham muito ajudam para que o ambiente não se adultere, tarefa ingrata, com a interpretação em estúdio. O adorno floreado do piano de Paulino Vieira e o cavaquinho sincopado de Bao, são outros dos atractivos que fazem com que Mar Azul a par de Miss Perfumado continue a ser um trabalho maior de Cesária.
Tive a sorte de a ver e ouvir ao vivo, pouco depois de ela ter gravado esses dois discos. Penso que depois e com a sua entrada no showbizz em ritmo demasiado acelerado e ao sabor dos ditames editoriais, perdeu bastante do seu magnetismo e desbaratou pedaços d'alma...
Mas é sempre bom recordar este Mar Azul.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Mari Boine Persen - Gula Gula

Marie Boine Persen, incialmente, depois Mari Boine apenas, é uma senhora de berço Sami, povo indígena do Norte norueguês, território também conhecido por Lapónia. As origens genéticas deste povo continuam a ser um mistério para os investigadores e, análises de DNA têm atribuído a estes habitantes duma região que abrange parcelas da Noruega, da Finlândia, da Suécia e da Rússia, cromossomas ibéricos (portugueses???), asiáticos e até americanos índios! Cantora e lutadora pelo seu povo, nem sempre por ele compreendida, face à sua renovação musical e à sua condição de mulher na sociedade. Esta foi a minha primeira incursão radical nos sons do mundo e devo-a, tão simplesmente, a um dos meus mais respeitados músicos: Peter Gabriel. Havia já algum tempo que tinha curiosidade de aprofundar o catálogo da Real World e foi por aqui que comecei. Tive a grata experiência de assistir a um concerto de Mari. Bonito, envolvente, luminoso! Esta é a sua primeira obra. Daí para cá a sua música modificou-se, ganhou novas colorações, utilizou outros apetrechos, mas nunca se afastou das suas honoráveis raízes.

Gula Gula


quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Silvana Deluigi - Tanguera

Corria o ano de 1992, tinha eu um programa de rádio que ia para o ar diariamente, de 2ª a 6ª feira, na Rádio Independente de Aveiro, chamado "A Paixão Segundo a Noite". Por falta de apoios publicitários, passou a ser feito apenas nas noites de 5ª e 6ª e depois acabou, com alguma pena minha. Tive, por essa altura, que investir na actualização da minha discoteca e fi-lo de forma bem intensiva. Foi também nesse tempo que comecei a reinstalar o meu aparelho senso-auditivo, saturado das sempre mesmas músicas. Pus-me à descoberta das ditas alternativas, no rock, na pop, na country, na folk, eu sei lá...
Todas as semanas, lá ia eu à loja do Centro Comercial Oita, local de compras por excelência nessa época e o empregado, sempre afável, já tinha sempre pronta uma molhada de cd's para eu ouvir e escolher. Certa vez, no meio de uma dezena de discos, lá estava este, que pus logo de lado, pensando ter sido colocado ali por lapso. Mas o empregado disse que não, fôra propositado e insistiu para que eu o ouvisse. Em boa hora! Foi a primeira vez que ouvi o Tango cantado, já que a única referência longínqua que dele tinha, era a de Gardel e apenas de nome. Foi também a partir daqui que fui em busca de Piazzolla e do Novo Tango. Este é um daqueles discos que sem hesitações levaria para o exílio na tal ilha deserta, para me ajudar a nunca esquecer das emoções!

P.S. - Aqui vai também a minha primeira experiência de download do CD na íntegra:
Tanguera
Se tiverem alguma dúvida para executar a operação, posso dar uma ajuda. Se se depararem com dificuldades para baixar, transmitam por favor.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

1ª Missão Cumprida

A primeira etapa está cumprida. Os discos que mais me tocaram durante o ano de 2007 aqui foram publicados, com uma pequena amostra na Minha Caixinha de Música. Para a semana começarei a colocar alguns cd's mais antigos e que me ajudaram a formar o meu gosto muito pessoal pelas músicas do mundo. Gostaria, no entanto, de obter da vossa parte, uma breve opinião sobre o que já aqui trouxe e de pedir ajuda para decidir se, no futuro, deverei colocar links para download completo de alguns albúns. Para já quero agradecer aos prevenidos que cá vieram ter e aos desprevenidos que aqui caíram...

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Amália - Segredo

Não vou falar de Amália, pois já tanto foi, é e será dito. Apenas quero dizer que tive um privilégio raro que me proporcionou pisar o mesmo palco que a grande senhora, numa fase em que começava a exibir alguns sinais de decadência, sobretudo na sua forma de cantar. Talvez por isso e pelo tal casulo de preconceitos que a minha então tenra idade arrastava às costas, desdenhei da sua voz e recusei o seu fado! Aqui me penetencio e lhe presto a minha atrasada homenagem. O fado que abre este albúm, ouvi-o sentado, parado ao volante do meu carro, paralisado, no momento em que decorria a sua cerimónia de despedida deste mundo. Ouvi depois o Grito, difundido na própria cerimónia, o fado que era sua vontade expressa que fosse ouvido durante o seu funeral. Uma emoção atrás de outra. Voltei a ouvir    o Medo quase oito anos depois. Soberbo, o poema, crua e magistral, a sua voz! Como ela própria diria, quando ouvia Carlos Paredes nos seus célebres serões caseiros, até apetece bater-lhe...
É o medo, o dela e o nosso!

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

Amestoy Trio - Le Fil

Música difícil de classificar, pelo menos para mim, e que andará à volta do swing e do jazz manouche, da valsa musette, temperada com vários cheiros mediterrânicos e latinos. Há, pelo meio, visitações que hesito em situar, à mistura com valsas e outras danças. Um acordeão, uma guitarra e uma tuba, formam este ensemble de virtuosos que têm o condão de nos atingir com a simplicidade das coisas terrivelmente bem feitas! Os instrumentos entrelaçam-se de forma solta e fresca, nós inspiramos profundamente e somos levados pelo som etéreo, campestre e gracioso.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Rónán Ó Snodaigh - Tip Toe

Este músico de facetas camaleónicas, vem desenvolvendo a sua estrutura musical em vertentes díspares, mas sempre tomando como base a tradição irlandesa e sem se desligar dos Kila, a sua banda de sempre. Tocador exímio de bodhran e detentor de uma voz absorvente e expressiva, lavador de chãos e poeta, daquilo que conheço, pouco, eu sei, julgo-me diante de um dos mais interessantes e renovadores artesãos da música celta. De entre os seus vários contributos e participações, destaco os que foram dados aos Dead Can Dance ou a Baaba Maal. Já se exibiu em Portugal, mas não sei onde, nem quando. E já tenho debaixo de olho e de ouvido um belo trabalho que produziu com o músico japonês Oki. Da distante e linda Irlanda, sempre nos chegam bons ventos de melodia!

quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Eliseo Parra - De Ayer Mañana

Músico da velha boa guarda espanhola, iniciado no rock durante a década de 60, cedo determinou que necessitava de aprofundar os seus conhecimentos académicos, pelo que se inscreveu no Conservatório de Barcelona e mais tarde na Aula de Jazz Y Percusión na mesma cidade. Depois de mais de vinte anos de estudos e a integrar vários grupos e orquestras, inicia uma carreira a solo onde engloba a sua própria composição com o folclore espanhol, namorando todo o som latino e o jazz. Nós, portugueses, temos também um cantinho na enorme caixa de música deste compositor e intérprete brilhante. Um grande desconhecido para mim, mais outra vergonha, que não vou parar de divulgar a quem se apreste a colocar as antenas sempre bem orientadas. Eliseo Parra é um intermediário que recolhe e transporta uma herança musical e a vai entregando aos mais novos, para que o ciclo se perpetue e a cultura prevaleça.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Amadou & Mariam - Wati

A riqueza da música do Mali aqui representada por este duo maravilha. Chamam a isto, genericamente, de Afro-Blues! Amadou Bagayoko e Mariam Doumbia, meninos da minha idade, conheceram-se numa instituição para jovens cegos, casaram-se e foram muito felizes...assim poderia acabar a história, mas eles quiseram muito mais, fizeram da música o seu grito de vida e durante duas décadas labutaram até ao reconhecimento amplo de que hoje dispôem. Atingem o auge da sua carreira quando são convidados a gravar o hino oficial do campeonato do mundo de futebol de 2006, mas esse é um acto menor, comparado com toda a sua produção. Uma mistura explosiva de guitarras eléctricas, metais e percussões variadas e sonoridades que vão desde o tradicional da sua terra natal até ao Médio Oriente, passando pela Índia e pelas Caraíbas. Se os olhos se perderam, os restantes sentidos dispararam em sensibilidade e ritmo.

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Xaile - Xaile

A primeira vez que tive contacto com este grupo, foi apenas visual, numa TV sem som e fora de horas. Mas o silêncio despertou-me a curiosidade de saber a que soaria aquela mise en scène invulgar no contexto musical português. Foi no YouTube que consegui ouvi-los pela primeira vez e de tal forma gostei que não perdi tempo para conseguir o álbum. Fechando os olhos e escutando mais longe, encontraremos Zeca Afonso ou Fausto, Clannad, flashes que vão de África ao Brasil, palavras do nosso imaginário de criança, giroflé, pouca-terra pouca terra, sape gato lambareiro! É a pop fluida, são as melodias vindas da raiz tradicional portuguesa, são os jigs, o jazz e o funk. Três lindas raparigas que não só cantam, como tocam vários instrumentos e o mentor de tudo isto, Johnny Galvão, compositor, letrista, produtor, arranjador e instrumentista. Este é um disco que se ouve duma assentada e não para de nos surpreender em cada volta de chula ou malhão. A música portuguesa arejando as suas gavetas!

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Yungchen Lhamo - Ama

Nascida bem perto da cidade monástica de Lhasa, dali saiu com 23 anos rumo à Índia, atravessando os Himalaias e fugindo à opressão chinesa no Tibete. Daí até aos dias de hoje vai um longo trajecto musical e de vida que passou pela Austrália e pelos Estados Unidos. Aproveitou-se, no melhor sentido, de artistas como Annie Lennox, Billy Corgan, Sheryl Crow ou Natalie Merchant, actuando ao seu lado e dando a conhecer a sua música e a do seu povo. Foi a primeira cantora tibetana a assinar contrato com a Real World de Peter Gabriel e o seu trabalho foi produzido por Hector Zazou. Apesar da tentação de diluir as suas tradições de forma irremediável no grande caldeirão da música pronto-a-ouvir, tem mantido uma solene divulgação das suas raízes ancestrais, sem ser conservadora na sua abordagem e mantendo a sua original pureza.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Tinariwen - Amassakoul

Banda tuaregue, de imagem poderosa, com seus trajes e turbantes, formada por autênticos guerrilheiros da música, da palavra e da rebelião armada. Às metralhadoras a tiracolo juntaram as guitarras eléctricas e percorrem as areias com os seus cantos de revolta. A esta música de raiz tão funda, não ficaram indiferentes estrelas como Robert Plant ou Elvis Costello. Até o jurássico Carlos Santana se vergou ao encanto deste oásis sonoro. Thom Yorke confessou ter-se inspirado na sua música para compôr partes do seu disco a solo. A sua página oficial na web é das melhores que conheço e dispensa-me de mais comentários. Os Blues do deserto, ou uma hipnótica narrativa lírica, com vigor e com formosura.